Read online book «O Médico Enigmático» author Serna Moisés De La Juan

O Mådico Enigmàtico
Serna Moisås De La Juan
Tinha levado menos tempo do que o calculado no trajeto, porque com estes avan?os nos meios de locomo??o eu mal tinha percebido ele enquanto estava revisando algumas pàginas do jornal que eu havia comprado momentos antes na esta??o. Tinha levado menos tempo do que o calculado no trajeto, porque com estes avan?os nos meios de locomo??o eu mal tinha percebido ele enquanto estava revisando algumas pàginas do jornal que eu havia comprado momentos antes na esta??o. O que eu achei mais dif?cil naquela viagem foi tomar a decis?o final, aquela que sempre deixa d?vidas como as borras de um bom cafå no fundo da x?cara, sobre se a op??o escolhida era a mais correta ou n?o, mas depois de uma noite de sono profundo resolvi o problema com determina??o e comecei este que seria, sem d?vida, o meu destino mais desejado. Finalmente me encontrei diante de um dos mais belos e majestosos portais medievais preservados, portas de pedra esculpidas com esfor?o e cuidado por experientes pedreiros na arte de converter o material frio e àspero das pedreiras prîximas em belas colunas, linteis e arcos.


O
Mådico
Enigmàtico

Juan Moisås de La Serna

Traduzido por Valåria Cristina Ferreira Ventura

Editorial Tektime

2019
“O Mådico Enigmàtico”
Escrito por Juan Moisås de La Serna
1? edi??o: junho 2019
© Juan Moisås de La Serna, 2019
© Edi??es Tektime, 2019
Todos os direitos reservados
Distribu?do por Tektime
https://www.traduzionelibri.it

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Prîlogo
Tinha levado menos tempo do que o calculado no trajeto, porque com estes avan?os nos meios de locomo??o eu mal tinha percebido ele enquanto estava revisando algumas pàginas do jornal que eu havia comprado momentos antes na esta??o
O que eu achei mais dif?cil naquela viagem foi tomar a decis?o final, aquela que sempre deixa d?vidas como as borras de um bom cafå no fundo da x?cara, sobre se a op??o escolhida era a mais correta ou n?o, mas depois de uma noite de sono profundo resolvi o problema com determina??o e comecei este que seria, sem d?vida, o meu destino mais desejado.
Finalmente me encontrei diante de um dos mais belos e majestosos portais medievais preservados, portas de pedra esculpidas com esfor?o e cuidado por experientes pedreiros na arte de converter o material frio e àspero das pedreiras prîximas em belas colunas, lintåis e arcos.
Dedicado aos meus pais
?ndice de contenido
Prîlogo (#ue4d80f76-7a6a-5765-a277-f23e4cdd935c)
CAP?TULO 1. A VOLTA (#u6a4a0a7c-522c-5f92-9e83-79289d4cd29b)
CAP?TULO 2. A CRUZ (#litres_trial_promo)
CAP?TULO 3. A CIDADE (#litres_trial_promo)
CAP?TULO 4. O MENINO DA ÀGUA (#litres_trial_promo)
CAP?TULO 5. O PARENTE (#litres_trial_promo)

CAP?TULO 1. A VOLTA
Tinha levado menos tempo do que o calculado no trajeto, porque com estes avan?os nos meios de locomo??o eu mal tinha percebido ele enquanto estava revisando algumas pàginas do jornal que eu havia comprado momentos antes na esta??o
O que eu achei mais dif?cil naquela viagem foi tomar a decis?o final, aquela que sempre deixa d?vidas como as borras de um bom cafå no fundo da x?cara, sobre se a op??o escolhida era a mais correta ou n?o, mas depois de uma noite de sono profundo resolvi o problema com determina??o e comecei este que seria, sem d?vida, o meu destino mais desejado.
Finalmente me encontrei diante de um dos mais belos e majestosos portais medievais preservados, portas de pedra esculpidas com esfor?o e cuidado por experientes pedreiros na arte de converter o material frio e àspero das pedreiras prîximas em belas colunas, lintåis e arcos.
Um monumento imperec?vel e imîvel, um espectador silencioso da lenta passagem das dåcadas que deixa de pequenas e min?sculas fendas a grandes vazios, como marcas indelåveis do passar do tempo, como sulcos indelåveis mais prîprios do rosto cansado de um anci?o de idade avan?ada.
Uma testemunha inevitàvel dos acontecimentos que ocorreram a seus pås, desde as åpocas de maior esplendor e auge, de grande nobreza e festan?as, o centro dos mais destacados senhores e o ber?o de distintos artistas, estudiosos e filîsofos, atå ?quelas åpocas que foram especialmente dif?ceis para os seus habitantes enfrentando duras batalhas, que provocaram enquanto foi poss?vel a fuga em massa de seus vizinhos.
Uma espetacular fortaleza natural localizada na colina de uma grande rocha, como um mosteiro, distante e isolada do mundo, suas encostas s?o atravessadas por um amplo e sinuoso rio que a envolve como um fosso natural, que aumenta seus dotes defensivos e a transforma em um extraordinàrio e forte lugar a conquistar, testemunhado pelos in?meros fracassos de seus inimigos que viram seu ?mpeto frustrado para conseguir o saque t?o desejado.
Uma cidade milenar com um grande patrimînio histîrico-monumental com o qual se pode deleitar onde quer que se olhe, com casas antigas preservadas em t?o bom estado que å fàcil adivinhar como as pessoas viviam hà såculos.
Um belo destino de muito charme, com edif?cios centenàrios cheios de histîria, lugares escondidos que ainda cheiram a velho e que parecem melhorar a sua espetacularidade com o tempo como bom vinho.
Uma cidade rodeada de muralhas largas e guardada por ameias de ferro, cujo acesso sî podia ser feito a partir daqueles enormes pîrticos ricamente esculpidos e ornamentados com bras?es, dentro dos quais se estendia uma rede de ruas estreitas, terminando em frente as edifica??es mais comemorativas ou em frente a belas pra?as com terra?os vividamente coloridos pelas mais belas flores.
E tudo isto num lugar sem igual, uma extraordinària combina??o da natureza na sua forma mais pura com a arquitetura mais modesta, que me cativou desde o primeiro momento em que a vi e cuja memîria me acompanhou ao longo da minha vida, pois o tempo n?o tinha conseguido abalar na minha memîria.
Esta era a segunda vez que eu vinha, mas agora era diferente, eu n?o me sinto como um estranho, um turista em busca de uma bela recorda??o, ansioso para viver algo memoràvel para contar aos meus companheiros e amigos quando eu voltar para casa, agora eu n?o venho de passagem, eu sinto que estou no lugar que corresponde a mim e pretendo ficar. Mas para isso eu teria que resolver uma pequena mas importante quest?o, para a qual eu tinha gasto muito tempo pensando em poss?veis alternativas sem encontrar qualquer solu??o, conseguir um emprego com o qual pudesse pagar minha estadia e minha manuten??o.
Anteriormente e sem ter deixado cair os anåis, eu tinha realizado muitos e variados trabalhos, desde os mais simples e ao mesmo tempo fisicamente custosos, como trabalhador de obras, atå aqueles que exigiam o desenvolvimento de habilidades especiais no tratamento com as pessoas e no momento de lembrar datas e nomes, como o de guia tur?stico.
Eu tinha me defendido mais ou menos muito bem nestas tarefas que n?o implicavam qualquer responsabilidade ou obriga??es maiores do que a de cumprir o meu dia de trabalho e esperar receber o pagamento correspondente no final do dia, independentemente de qual fosse a jornada de trabalho.
Ainda que seja verdade que tinha prefer?ncias entre uns trabalhos e outros, porque as for?as e energias que me acompanhavam na minha juventude foram dando lugar ? quietude e tranquilidade da maturidade, de modo que o esfor?o que fazia com as tarefas de constru??o ou de campo jà se tornavam eternas e pouco gratificantes.
Por outro lado, o trabalho de guia era cada vez mais atraente para mim, n?o sî porque n?o exigia tanta dedica??o f?sica, mas porque eu ficava muito mais grato no que diz respeito ? remunera??o, especialmente quando, alåm do pagamento acordado, obtinha generosas gratifica??es dos clientes que se sentiam geralmente satisfeitos por terem tido uma boa viagem, em que tinham aprendido alguns aspectos que certamente lhes eram desconhecidos.
Com este trabalho de guia aprendi muito, porque cada cliente que vinha tinha seu prîprio interesse em conhecer um aspecto ou outro dos lugares que eu mostrava, atå mesmo ocasionalmente o visitante conhecia detalhes da histîria do lugar que para mim eram desconhecidos com o qual muito me enriquecia, e ser t?o bem pago me permitiu poupar algum dinheiro para viajar que no final me levou atå aos mesmos port?es desta cidade.
Alåm de aprofundar meu conhecimento dos lugares que visitei, tive uma certa curiosidade em conhecer alguns dos mistårios que envolvem a condi??o humana, querendo desvendar um pouco mais sobre como ao longo da histîria as diferentes civiliza??es t?m levantado as mesmas quest?es essenciais, oferecendo respostas distintas e atå contraditîrias de um lugar para outro.
Querer conhecer e controlar os acontecimentos futuros, saber o que vem depois desta vida e se hà algo alåm do que vemos e tocamos; procurar o sentido ?ltimo da nossa exist?ncia ou tentar entender por que, como espåcie, somos t?o diferentes do resto dos seres vivos da natureza, quest?es importantes que cientistas, estudiosos, filîsofos, oradores e atå charlat?es t?m tentado resolver.
Todos eles procurando acalmar as consci?ncias inquietas de alguns ansiosos por compreender o mundo que os rodeia e o seu futuro, o qual por vezes se mostra t?o incerto como imprevisto, podendo se apresentar extremamente benevolente ou cruel.
Mas, para minha surpresa, em vez de encontrar uma ?nica resposta que revela uma verdade superior, vàlida para todos e em todos os momentos, encontrei uma amàlgama de respostas parciais, que refletia mais o interesse particular dos governantes que chefiavam os povos, sejam pol?ticos, militares ou religiosos, do que um verdadeiro conhecimento independente do poder.
O que me enchia de espanto quando eu refletia sobre isso, era como o homem n?o havia podido chegar ? verdade depois de tanto tempo?, e se tivesse chegado, o que era e por que n?o era conhecida e assumida por todos?
Com minhas roupas quase esfarrapadas, mais pelo excesso de uso que por falta de cuidado e higiene pessoal, passei entre aquelas massas de pedra esculpidas que formavam uma bela porta medieval, em cujo pîrtico orgulhosamente mostra aquele bras?o em relevo do escudo de armas de um dos maiores e mais poderosos governantes da Europa, sî comparàvel ? majestade alcan?ada por Napole?o ou pelo Rei Sol.
Ladeado por robustas muralhas amea?adoras que guardavam a ricamente decorada entrada, a cujos lados se estendiam aquelas inating?veis e grossas muralhas que separavam o mundo exterior conhecido do misterioso e t?o zelosamente guardado tesouro escondido atràs das volumosas e pesadas portas de madeira, refor?adas com ferro que se cruzavam para ficar amea?adoras, como lan?as em punho.
De acordo com os anos em que esta edifica??o se conservou em på e de sua espessura, atrevo-me a calcular para mim que foram milhares os operàrios que trabalharam nesta grande obra, tantos quantos poderiam ter sido utilizados para construir uma das catedrais majestosas da åpoca, um inegàvel tra?o da få fårrea e da conviv?ncia e cumplicidade da religi?o com o poder governador do momento.
Constru??es assim jà n?o s?o poss?veis, pois requerem uma idåia clara de como chegar a um fim t?o importante que vai sobreviver milhares de anos para alåm das breves vidas de seus construtores, tal como sucedeu antigamente para levantar as edifica??es mais longevas e lindas que o homem jà conheceu, as pir?mides.
Foram tempos dif?ceis para os povos submetidos, convertidos em escravos a fim de garantir uma m?o-de-obra barata, um trabalho minucioso e trabalhoso, sem outra recompensa que a de continuar vivos no dia seguinte, e com os oficiais brandindo seus chicotes ? espera de que alguåm se atrase para fazer uso justo deles para deixar a sua marca na pele daquele escravo.
Agora, uma situa??o como esta seria impensàvel, e ainda menos quando hà tantas màquinas, elevadores e guindastes dispon?veis, o que facilita grandemente qualquer tarefa pesada, com a qual parece agora rid?culo ter tantos trabalhadores envolvidos numa obra t?o colossal.
Alåm disso, agora seria desnecessàrio usar uns blocos de granito t?o grandes, jà que atualmente existem materiais mais resistentes, menos pesados e mais ràpidos de instalar, dando maior seguran?a, mas claro, isso å agora, antes… era o ?nico que tinham.
Era tudo t?o artesanal e rudimentar, com poucas ferramentas, todas elas manuais, utilizando principalmente a for?a bruta acompanhado de muita perseveran?a e capacidade de sacrif?cio.
Na verdade, n?o invejo nenhum desses infelizes trabalhadores que, com muito esfor?o e sofrimento, deram forma a uma edifica??o t?o luxuosa, pois certamente mais de um deixou sua vida neste trabalho, especialmente quando tiveram que faz?-lo sob este sol de justi?a, que fadiga e esgotam a vontade dos mais determinados.
A escolha desta cidade para a qual estou indo, atravessando uma passagem pequena, mas imponente, que separa o acesso da porta interna, e que serve como o ?ltimo contraforte na defesa, embora eu pudesse ter escolhido qualquer outro lugar neste momento da minha vida , senti-me internamente levado a vir aqui e tentar desvendar seus segredos.
Tenho visto muitos turistas admirar as constru??es antigas como as pir?mides espalhadas pelo mundo, tanto no Oriente Mådio como na Amårica Latina ou as mais recentes edifica??es, maravilharem-se da grandeza do Coliseu de Roma ou da altura da Torre Eiffel, em Paris.
Tenho sido testemunha de como alguåm se encolhia diante de monumentos gigantescos e estàtuas como a de David de Miguel Angelo, que representava a mitologia do lugar, mas o que ouvi desta cidade sempre foram maravilhas surpreendentes.
N?o sî por sua arquitetura rica, mas tambåm, nem por causa de sua histîria, que ela tem e muito! Å outra coisa! Algo que a tornou um ?m? por tantos e tantos anos, como um local de culto ou de peregrina??o que acolhe todos de bra?os abertos, sem distinguir entre homem ou mulher, grande ou pequeno, nem mesmo entre ra?a ou religi?o.
Muitas s?o as localidades que recebem devotos fervorosos ao longo do ano que viajam para os lugares que consideram especiais, ?s vezes indicados por uma constru??o megal?tica erguida ou por uma simples travessia como sinal ou monumento natural, como montanhas ou cavernas, ou que chegam certas åpocas do ano para comemorar uma data especial em que o ciclo sazonal muda como os solst?cios ou um evento extraordinàrio como os eclipses.
Mas um lugar como este em que me encontro n?o å encontrado todos os dias e, felizmente, tive a sorte de poder vir e viver atràs das suas portas, na zona mais antiga e humilde, mas para mim tambåm a mais aut?ntica e original.
Viajei meio caminho ao redor do mundo trabalhando como guia, visitando cada vilarejo, vila ou cidade, levando meus clientes de um lugar para outro, tentando ensinà-los e explicar o que eles estavam procurando por si mesmos.
Para alguns, eram as maiores maravilhas que a natureza havia esculpido pacientemente, durante såculos, como o Grand Canyon do Colorado ou as mais majestosas constru??es que se conservam atualmente.
Em contrapartida, outros procuravam o contràrio, lugares humildes mas n?o com menos encanto, onde pudessem ver a tradi??o de suas festividades, tentando abordar a histîria em estado vivo que pode ser contemplada em algumas cidades longe das grandes multid?es, onde å dif?cil chegar mas å dif?cil de ecoar, comentando nestes casos as histîrias de cada lugar, por vezes muito bem documentadas e outras quase improvàveis que se mant?m atravås da tradi??o oral entre os anci?os da localidade, conservando com ela a ess?ncia dos lugares visitados.
Eu mesmo fiquei surpreso com a beleza de alguns lugares que nem sequer estavam marcados no mapa, ou com o charme de alguns povoados que eram dif?ceis de encontrar devido ao seu pequeno tamanho, mas tudo ficou pequeno, quase insignificante, ao lado do que eu estava prestes a encontrar.
Pelo menos assim o vivia, com grande emo??o e incerteza, como uma crian?a a quem å dado um presente embrulhado, o qual a enche de inquieta??o e alegria ao mesmo tempo em que fica apreensiva por saber o que està por baixo desse embrulho cativante e impressionante, maravilhosamente ornamentado com uma grande fita vermelha.
Pela minha longa experi?ncia e pelo muito que falei com outros viajantes com quem encontrei em lugares t?o estranhos e escondidos, sei o que outros sentiram e vivenciaram quando chegaram aqui, e a ?nica coisa que eu esperava a este respeito era poder ter uma experi?ncia pelo menos semelhante ? que eles me contaram, algo que muda substancialmente a minha maneira de ver e compreender o que me rodeia, como o batismo que me introduz em uma nova vida, com o que me desperta para outra realidade e me transporta a um n?vel superior de compreens?o de mim e dos outros, talvez estivesse esperando demais, mas se outros jà haviam sido capazes de experimentà-lo antes, por que n?o eu?
Qualquer outra sensa??o de surpresa, admira??o e atå confus?o, seria uma decep??o para mim, porque jà a vivi, alåm do efeito moment?neo que recebi quando estava presente do que me surpreendeu, nada mudou em mim. Continuei sendo o mesmo que antes daquela vis?o, com meus defeitos e virtudes, sem transcender para alåm de tudo o que conhe?o e sinto, tudo o contràrio, ao que espero nesta cidade.
Talvez seja confiar demasiado numa constru??o t?o antiga, å provàvel que eu tenha de me contentar em ter uma boa estadia e que n?o tenha problemas, como me aconteceu em alguma ocasi?o, mas, hà que dizer tudo, nunca foi culpa minha, eu estava simplesmente no lugar menos indicado no momento mais inoportuno.
Ainda que isso, evidentemente, nunca tenha convencido as autoridades policiais ou judiciais, por isso tive de visitar em mais do que uma ocasi?o as paredes frias e h?midas da pris?o, onde a boa companhia de celas era escassa, sendo b?bados, perturbadores ou reincidentes, ou os tr?s ao mesmo tempo.
Foi um dif?cil aprendizado de humildade que eu tive que passar quando fui injustamente tratado, preso e mantido contra a minha vontade por dias atå que o julgamento fosse realizado e eu fosse libertado, mas enquanto isso eu estava sujeito a condi??es t?o precàrias que n?o desejaria isso ao meu pior inimigo.
Mas por estranho que pare?a, foi nesses sombrios ex?lios, precisamente na quietude da noite quebrada apenas pelo vaguear do carcereiro para verificar se tudo està em ordem ou pelo comentàrio vil de algum outro prisioneiro reclamando de seu confinamento.
Na escurid?o da minha pequena sala emprestada, iluminada apenas pelo reflexo da lua cheia que å introduzida como um hîspede inesperado entre as grades de uma pequena janela no topo da cela, å ent?o que percebi que a nossa passagem pela vida tem de ser algo mais do que uma sucess?o desorganizada e por vezes arbitrària de momentos de alegria ou tristeza.
Como eu acredito que aconteceu com todos eles, eu recebi muitos paus ao longo dos anos, mas tambåm gostei, me diverti e compartilhei minha alegria com amigos e familiares, e suponho que ainda terei muitos bons e maus momentos para viver.
Mas algo dentro de mim se quebrou na primeira noite que tive que passar encolhido em um canto daquele quarto ?mido, onde eu enfrentei solid?o for?ada, sem ninguåm ao meu lado para me apoiar ou mesmo me ouvir, assustado com a idåia de n?o poder acordar no dia seguinte ?quela terr?vel experi?ncia que superou qualquer pesadelo que eu tivesse tido antes.
Pensando nisso, a minha vida n?o era t?o diferente da dos outros, talvez um pouco mais agitada e comovente, comparàvel ? de qualquer marinheiro que visite vàrios portos, ? dos pilotos de avi?es que por vezes amanhecem todos os dias num pa?s diferente, ou ? de um soldado que vai onde a sua pàtria o exige, Seja para impor a paz ou para participar em miss?es humanitàrias, profiss?es que, a longo prazo, tornam dif?cil recordar todos e cada um dos locais visitados, nem sequer å poss?vel recordar todos os bons momentos partilhados, nem as pessoas que se conhecem, sejam colegas, amigos ou qualquer outra coisa.
Talvez se eu tivesse nascido num desses grandes e inîspitos desertos, que surgem em quase todos os continentes como cogumelos que recordam a fragilidade do ecossistema em que vivemos e a necessidade de cuidar de um bem t?o precioso como a àgua, talvez eu tivesse tido este tipo de experi?ncia muito antes.
Se tivesse sido um nativo do deserto do Saara, outro berbere, um daqueles que atravessam as dunas sem fim, sob um sol de justi?a, ?s vezes sem outra companhia sen?o a do incessante vento escaldante que caprichosamente redesenha a paisagem, seguindo caminhos que n?o existem mas se cruzam hà gera??es, fazendo caminhos com as pegadas dos dromedàrios, instantaneamente apagada pela brisa silenciosa que silencia a voz afogada do tempo, orientada apenas por aquelas estrelas estàticas e luminosas, e pelas belas histîrias contadas de caminhante a caminhante em que se observa os lugares para abastecer-se de àgua ou onde se abrigar em caso de encontro com uma tempestade de areia.
Sendo assim, teria a oportunidade de experimentar, que eu n?o me sentiria diferente do resto, mas sim o contràrio, estaria mais ligado ao mundo que me rodeia, aceitando a natureza tal como ela å, sem questionar por que acontecem certos acontecimentos, e os outros pelo que s?o e n?o pelo que possuem, sem fazer distin??es entre pa?ses, ra?as ou religi?es.
Quando voc? anda pelo mundo tanto quanto eu, percebe que o que une a humanidade å sua capacidade de se reinventar continuamente e que muitas vezes nos limitamos a essas fronteiras, ?s vezes t?o absurdamente inventadas que dividem uma popula??o ou um vale em dois, transformando em inimigos os habitantes que atå aquele momento eram fam?lia e vizinhos.
Ou a linguagem, n?o haverà uma inven??o pior do que a linguagem que separa e divide, que impede a comunica??o fluida, que confunde e obstrui o processo de compreens?o? Quantas vezes eu jà vi outras pessoas sofrerem por n?o serem capazes de se comunicar adequadamente, tentando gesticular para para se explicarem, injustamente detidos, ou sofrendo a indiferen?a e o desprezo daqueles que n?o os compreendem?
Quando voc? quer dizer alguma coisa e os outros n?o te compreendem, turistas, visitantes, imigrantes ou exilados t?m de enfrentar a nova realidade, vendo-se for?ados a aprender um novo idioma como meio para sobreviver, e n?o apenas para poder encontrar um trabalho.
Para mim n?o hà pior do que a inven??o desses dialetos que surgiram como castigo pela arrog?ncia humana, pelo menos å assim que os Livros Sagrados os recolhem quando se lembram com vergonha do que aconteceu com a torre de Babel, que seria a maior constru??o da humanidade, que chegaria com seu cume ? abîbada celeste e ficou inacabada como s?mbolo da dissolu??o desse povo, que se acreditava ser t?o superior.
Seja qual for a origem das l?nguas diferentes, estas ao longo da histîria, em vez de servir para comunicar-se melhor, separam e dividem comunidades em guetos, impedindo a troca de ideias e experi?ncias fluidas, chegando a confundir e dificultar o processo do entendimento, em prol de um falso modernismo e ideal de diferencia??o e independ?ncia.
Apesar de terem sido feitas muitas tentativas para ultrapassar estas diferen?as, tentando dominar uma l?ngua sobre as outras, durante muitos anos o ingl?s tem sido a l?ngua dominante a n?vel comercial, enquanto o franc?s, em termos de diplomacia e rela??es entre pa?ses, tem sido a l?ngua dominante. Inclusive chegou-se a criar uma l?ngua que inclu?sse uma boa parte das l?nguas ocidentais existentes, com a ideia de substitui-las todas, estabelecendo assim uma l?ngua ?nica e universal, o esperanto.
Um belo sonho de unidade sob uma ?nica l?ngua que procurava facilitar a comunica??o entre os povos, evitando assim conflitos, disputas e invejas, conduzindo ao interc?mbio e ? compreens?o, criando, em ?ltima anàlise, uma sociedade onde todos pudessem compreender, independentemente do lugar, ra?a ou religi?o de origem.
Um sonho que ficou no esquecimento, presente apenas aos mais nostàlgicos e que poucos se empenham em manter vivo, com a esperan?a de que um dia, aquilo que nos une, superarà o que nos diferencia e nos separa, e que criou tantos problemas e dificuldades no que diz respeito ? conviv?ncia.
Quantas vezes vi pais sofrerem com seus filhos, detidos nas fronteiras por quererem acessar o que entendiam ser um mundo melhor para sua fam?lia, apenas por n?o serem capazes de se comunicar adequadamente, tentando gesticular para se explicarem, presos injustamente enquanto sofriam a indiferen?a e o desprezo daqueles que n?o entendem ou se importam em entender a sua situa??o.
Ou profissionais altamente qualificados que se mudam para outro pa?s e t?m de recome?ar a sua vida profissional, assumindo empregos abaixo do seu potencial e que nunca pensaram que poderiam desenvolver por serem considerados demasiado simples e desmotivantes, e tudo porque n?o dominavam a l?ngua do pa?s de acolhimento.
Å o que acontece com turistas, visitantes, imigrantes ou exilados, quando eles querem dizer algo e outros n?o os entendem, ent?o eles t?m que enfrentar a nova realidade lingu?stica, sendo for?ados a aprender o que atå agora era uma l?ngua desconhecido, tanto para encontrar trabalho quanto para sobreviver naquele pa?s estranho durante sua estadia.
Um esfor?o de adapta??o que n?o faz distin??o de idade ou condi??o, jà que afeta a todos igualmente quando devem emigrar ou quando a perman?ncia no pa?s se torna algo mais longo do que uma simples viagem tur?stica.
Mas se a injusti?a se refere, o mais aborrecido para mim å o sofrimento causado de propîsito e sî justificado por ter a pele de outra cor ou por algo t?o ?ntimo e pessoal, como å a pràtica de qualquer outra religi?o.
Quanta loucura no mundo, ao querer diferenciar-nos, dividir-nos e separar-nos, assinalar a uns e a outros, de acordo com sua ideologia, g?nero, ra?a ou cren?a, e tudo para qu??
Talvez alguåm, em algum lugar, pode considerar-se o dono da verdade, tanta dor infligida e justificada com verdades t?o fracas que dificilmente cabe em sua cabe?a como, “meus pais estavam nestas terras antes de voc?s” ou “se eu deixà-lo eu tenho que deixar qualquer um que venha depois”.
Å verdade que quando comecei esta vida de transeunte eu sabia que teria a oportunidade de conhecer em profundidade a condi??o humana, os melhores atos de generosidade e amor, e a sujeira mais inenarràvel, que eu iria assistir a momentos de alegria e outros amargos, dos primeiros eu estou feliz e orgulhoso de ter sido capaz de participar das alegrias dos outros, dos ?ltimos …, muito eu tive que manter o sil?ncio como uma forma de sobreviver, mesmo que ?s vezes eu tinha que morder a l?ngua para n?o gritar e processar as injusti?as e ultrajes a que se viam submetidos seus semelhantes.
Provavelmente nunca terei tempo para registrar minhas muitas e m?ltiplas aventuras ao redor do mundo, os lugares conhecidos, as pessoas com quem tive encontros esporàdicos, os costumes e ritos mais estranhos e exîticos, e tudo gra?as a uma decis?o.
Agora estou prestes a tomar a minha segunda grande decis?o na vida, pelo menos eu me sinto dessa forma, å provavelmente algo trivial para os outros, sabendo onde voc? vive ou quanto tempo voc? vai ficar no mesmo lugar, mas para mim å t?o importante …, quantas anedotas eu posso contar simplesmente por fechar os olhos e lembrar de um lugar nesta Terra, tantas experi?ncias acumuladas, e mais surpreendentemente mais positivo.
Å verdade que surgiram momentos de dificuldade, outros em que eu n?o tinha certeza que poderia sair de um deles, mas estes foram se dissipando entre os outros bons dos quais me enriqueci mais com o contato de pessoa a pessoa.
Os edif?cios, monumentos, estàtuas e outras obras do homem sempre me pareceram algo temporàrio, mesmo amostras de banalidade, cachoeiras, desfiladeiros e desertos, pelo contràrio, t?m sido t?o semelhantes a mim de um lugar para outro, å verdade que o calor pode afetar a terra de diferentes maneiras dependendo da sua latitude ou da composi??o do solo, mas em ambos os casos s?o fendas e areia, desfiladeiros ou gargantas, por vezes quebrados por cascatas espetaculares e abundantes ou por fios finos que, como se fossem feitos de prata, lan?am o seu precioso l?quido no fundo do canal, mas o que sempre foi diferente foram as pessoas, cada uma com as suas experi?ncias e experi?ncias anteriores, com a sua forma de pensar e compreender a vida e o mundo, com as suas cren?as e valores, que foi para mim uma descoberta.
N?o å que me considere um filîsofo ou algo assim, e por isso me atraia mais, ver e compreender a natureza humana, que outros aspectos da vida. Nada mais longe da realidade, era uma descoberta verificar como cada um tem dentro de si a possibilidade de ser o melhor e o pior de cada vez, e que sî depende da vontade da pessoa.
N?o sî me refiro ? felicidade, esse conceito para muitos nos escapa e parece estar reservado apenas para alguns poucos agraciados por pais abastados ou um negîcio pessoal frut?fero ou simplesmente por acaso, tornando-os felizes com um bom pr?mio na loteria, mas para o resto dos mortais esse conceito de felicidade contradiz o esfor?o diàrio de se levantar e ir trabalhar, voltar depois de vàrias horas de trabalho duro e intenso, e ver que o que resta do dia å compartilhar com seus entes queridos os momentos de relaxamento e pouco mais, e no final da noite voc? pensa novamente como no dia seguinte voc? terà que continuar com a rotina cansativa da vida profissional, esperando por aqueles dias quase màgicos, onde tudo pode ser desejado, as fårias.
Momentos de distrair-se e esquecer-se de qualquer tarefa para concentrar-se apenas em desfrutar com a fam?lia e amigos de uns dias de lazer e descanso, mas a realidade ?s vezes n?o faz nada, sen?o nos lembrar o que realmente å a nossa vida, e surgem problemas de ?ltima hora.
Chamadas do trabalho para resolver algum imprevisto que surgiu no escritîrio, problemas com os c?njuge com quem parece que voc? n?o se dà bem tambåm como atå esse momento voc? acreditava, e tudo acontece nesses dias màgicos, que para mais de um se tornam momentos de nervosismo desejando voltar ? rotina de trabalho, mas para mim, conhecer uma pessoa ou outra tem me permitido ver e entender outras realidades, mesmo entender como outros v?em que essa vida monîtona que outros reclamaram tanto.
“O trabalho dignifica a pessoa”, longe de ser uma frase um pouco estranha para o seu conte?do, revela-se que å a base de uma religi?o, e å precisamente no esfor?o para realizar o melhor poss?vel as tarefas que os fiåis investem o seu tempo.
Uma maneira incr?vel de mostrar como nem todos vivem da mesma maneira as circunst?ncias que aconteceram, o que me permitiu relativizar minhas prîprias experi?ncias tentando imaginar ?s vezes como seria se eu fosse um monge tibetano ou um ?ndio amaz?nico.
Å provàvel que nunca tenham tido de enfrentar o stress diàrio da grande cidade, onde se perde mais de uma hora para chegar de casa ao trabalho, para o qual se tem de atravessar meia cidade, cheia de semàforos e na qual se encontram aqueles pobres trabalhadores que vivem com as esmolas que recebem pelo seu trabalho de limpeza do pàra-brisas.
Uma imagem que se reduz quando o frio aperta nos meses de inverno, apesar de que sempre tem alguåm tentando sobreviver com o pouco que recebem por seu trabalho.
Tambåm n?o acho que eles sabem o que å lutar contra si mesmos e seus colegas para se destacar no trabalho, ?s vezes tendo que pisar em seus prîprios valores, a fim de obter o seu trabalho feito, sabendo que pouco a pouco voc? n?o å mais a pessoa que està animado em dar o melhor de si mesmo, passando a se juntar ? lista daqueles que perderam qualquer vest?gio de auto-estima, agora focada em satisfazer as exig?ncias de seus chefes sem se importar se isso poderia contradizer ou violar qualquer cren?a ou valor pessoal anterior.
Å provàvel que outras pessoas passem por piores condi??es pessoais, familiares e atå sociais, mas, estresse, n?o acho que possam viver enquanto isso for feito em uma cidade grande, mudando tanto que ?s vezes å dif?cil identificar suas ruas atravås dos estabelecimentos que as adornam, uma vez que estes variam de m?s para m?s, e onde antes havia uma cafeteria agora hà uma sapataria e amanh? pode haver um bar.
Porque isso sim, os estabelecimentos que distribuem bebidas e bares t?m-se tornado gradualmente proprietàrios de esquinas e vielas, aumentando a sua influ?ncia em todas as classes sociais, como medida de evas?o e fuga desse stress galopante que å provocado por um trabalho entediante, repetitivo e chato, sem sentido maior do que terminar a tempo de sair, sem ter de fazer horas extraordinàrias n?o remuneradas.
Um lugar de encontro, mas tambåm um lugar de desinibi??o onde a pouca dignidade humana que resta se perde atravås de bebidas alcoîlicas e conversas in?teis com o gar?om em servi?o. Uma forma de apagar da nossa cabe?a e nosso cora??o as horas pråvias de entrega e esfor?o em uma causa sem sentido, alåm de poder conseguir o t?o desejado p?o de cada dia.
Tenho visto e falado com pessoas pobres com dignidade, que conhecem sua situa??o e a aceitam, embora ?s vezes n?o saibam como sair dela, mas em outras ocasi?es me encontrei e falei com outros que, apesar de terem mais do que poderiam passar em suas vidas inteiras, n?o sabem como desfrutà-la, e n?o me refiro aos prazeres mas ao resto, o que nos torna seres vivos e inteligentes, compartilhando com os outros e vivendo com eles.
Tudo isso agora pertence ao passado, porque, gra?as ? minha decis?o, que eu considero a segunda mais importante da minha vida, eu me encontro em uma cidade espetacular e encantadora, eu nunca imaginei acabar aqui, n?o porque era um lugar ruim, mas porque era t?o longe de onde eu morava, e alåm disso, å tudo t?o diferente.
Sem barulho, sem confus?o, sem multid?es apressadas, sem filas longas e opressivas…, å uma daquelas cidades medievais onde o tempo parece n?o ter import?ncia, passeando tranquilamente admirando os arredores sem vendedores saindo para oferecer seus produtos, seguindo-o e quase assediando-o a cada esquina, como acontece com tantos que v?o de viagem a lugares exîticos.
Uma cidade onde ? medida que avan?a o sol muda a tonalidade das muralhas oferecendo uma perspectiva diferente de suas ruas e casas.
Um lugar que å capaz de transportà-lo por um instante para outro tempo, dando-lhe a sensa??o de viver no mesmo lugar que os romanos, aqueles legionàrios ferozes que se espalharam pelo mundo conhecido pela espada, mas, acima de tudo, gra?as ? sua ordem e organiza??o, uma ?nica l?ngua, um ?nico Deus, o Cåsar. Em troca, agora, do seu grande esplendor sî restam muitas ru?nas por uma extensa regi?o que chegou de costa a costa do Mediterr?neo e atå as terras altas da Europa.
Talvez seu maior legado seja justamente o idioma, embora agora tenha deixado de ser um ?nico, jà que vem se desintegrando, ramificando, inovando e caminhando atå tornà-los quase inintelig?veis entre si.
O que a princ?pio era motivo de orgulho e de identidade tornou-se um problema para aqueles que queriam dividir o poder para serem auto geridos, sem depender das ordens e indica??es de Roma, sem a necessidade de temer a sua repreens?o e sobretudo o seu exårcito, t?o disciplinado e obediente.
Tinha-o visto tantas vezes que jà n?o me parecia novo, irm?os contra irm?os lutando por insignific?ncia, sacrificando suas vidas porque alguns decidiram ter o que outros possuem, lutas in?teis que sî servem para engrandecer uns sobre os outros, e que estes ?ltimos est?o pensando na forma de voltar ao poder.
Mas aqui espero que seja tudo t?o diferente, que o îdio, a cobi?a, o desejo que fique tudo para tràs sem importar o que os outros aparentem Um lugar onde vale mais o esp?rito de coopera??o e ajuda ao outro que o ego?smo pessoal.
?s vezes, å verdade que muitos s?o os lugares chamados sagrados que atrai muitos fiåis e peregrinos procurando acalmar seus prîprios problemas e dificuldades, mas quando retornam para suas casas voltam a ter os mesmos, embora com um pouco de sorte tenham mudado, o que lhes permite viv?-lo de forma menos agressiva para com a sua pessoa e dar novas respostas que atå agora n?o lhes tinham ocorrido.
Para dizer a verdade, poucas pessoas que eu vi come?ar a caminhada comigo a terminaram, sempre esperando que sejam os outros que possam resolver os problemas, v?o ficando pelo caminho, com seus desejos e lembran?as.
As lembran?as, esse grande reator para uns e um grande apoio e impulso para outros, n?o hà nada pior do que viver no passado com as recorda??es vivas, as feridas abertas e a mente perdida em o que poderia ser e n?o foi.
Tanto tempo investido em querer mudar o imposs?vel, em querer que as circunst?ncias tivessem sido outras, de que o ocorrido n?o tenha acontecido, mas o passado se mantåm inerte, r?gido, frio, assistindo desde a parte de tràs do espelho refletindo nossos medos e alegrias, mas sem poder alcan?a-los, sem poder tocar alåm do reflexo.
Muitos tentaram passar pelo espelho, ser jovens novamente ou conseguir aquele amor perdido, mas å tempo e esfor?o in?til, porque a ?nica coisa que se perde å a prîpria pessoa, sua vida atual pensando no passado, mas hà outros, os mais afortunados que aprenderam a viver com o que eram e embora n?o em todos os casos foi agradàvel, Eles sabem que isso os marcou pela forma como est?o agora e por isso s?o gratos ?queles pequenos atos passados da vida, em que houve algumas circunst?ncias que lhes causaram feridas, mas ainda assim e com tudo isso, ajudou-os a serem como s?o agora.
O passado, esse jugo de culpa e vergonha, que como uma laje pesada esmaga e detåm os temerosos de suas prîprias a??es, impedindo-os de agir e seguir em frente com sua exist?ncia vulgar.
Por outro lado, para outros parece que n?o lhes diz nada, que sua vida necessita de histîria, negando a import?ncia das conseq??ncias de suas a??es, sem olhar ou aceitar os efeitos sobre sua vida e a dos outros, com uma inconsci?ncia comparàvel apenas ? dos adolescentes, que n?o v?em alåm de seus prîprios narizes.
Alguns jovens, devido ? intensidade do que est?o vivendo, em que lhes parece que o tempo està se esgotando, procurando ter e sentir novas sensa??es a cada momento, tudo lhes parece pouco, sem olhar ou entender que cada ato que fazemos tem conseq??ncias para nîs mesmos e para os outros, mas n?o querem saber nada sobre isso, e ent?o o que acontece, desde gravidezes indesejadas, a??es destrutivas contra outros, contra si mesmo, consumo de subst?ncias tîxicas para o organismo. Uma infinidade de a??es de que se arrepender no futuro, e viver com elas com pesar.
O passado, esse momento misterioso que se perde na memîria, como uma marca na areia ? medida que as ondas passam, mas o estranho å que ?s vezes parece t?o profundo e indelåvel, t?o doloroso e v?vido, e outras vezes dificilmente hà vest?gios desse fato.
Um cheiro, uma cor, uma can??o s?o suficientes para me fazer lembrar de sentimentos, sensa??es, a??es passadas, e me lembrar delas como se eu as estivesse vivendo naquele momento.
Circunst?ncias que jà nem se lembrava de ter vivido, se me aparecem como se pudesse tocar, cheirar e sentir de novo, mas estranhamente n?o as sinto como prîprias.
Å como se eu os visse refletidos na parede, ou como se me mostrassem naquele espelho, que me acompanha como fiel companheiro, mas n?o me deixa ver a decad?ncia dos anos, enganando-me com uma imagem quase juvenil e cheia de for?a de mim mesmo.
A primeira vez que percebi essa rea??o foi quando um jovem me chamou de “Senhor”. Costumava ouvi-lo chamar pessoas de meia-idade ou idosas, e ele me chamou assim.
Sa? correndo para o espelho mais prîximo, uma cristaleira que por causa da sombra do prådio em frente servia de espelho, ali me vi jovem e entusiasmado, como sempre havia sido, talvez, aquele rapaz estivesse errado, å provàvel que ele estivesse se referindo a outra pessoa, porque eu n?o me sentia senhor.
Tantas coisas que eu tinha que fazer antes de ser um senhor, era jovem e queria viver como tal, mas por que ele me chamava de senhor? Eu me olhei novamente e percebi algo que eu nunca tinha visto antes, eu tinha cabelos grisalhos! De onde eles vieram, quando apareceram?
Poderia ser devido ao esfor?o da minha juventude, mas isso era para me enganar, um cabelo grisalho å um sinal de maturidade, pelo menos eu n?o me lembro de ter visto nenhuma crian?a de cabelos grisalhos, era por isso que ele tinha me chamado Senhor! Eu continuei olhando, explorando meu rosto em frente ?quela janela que servia como um espelho improvisado e eu vi como ao redor dos meus olhos algumas rugas min?sculas apareciam. Com um dedo eu as esticava para verificar se elas estavam là e se elas realmente tinham surgido, o que isso significava?
Poderia ser um sinal de cansa?o, ?s vezes quando estou cansado fico com olheiras, bolsas pretas debaixo dos olhos, mas isso era diferente, estas pareciam n?o combinar com as outras. De repente e sem saber como a palavra “Senhor” ressoava dentro de mim repetidamente, serei eu um Senhor, onde estava a minha juventude, porque n?o me avisou, e porque a escondeu de mim?
Desde aquele dia eu n?o me olho no espelho novamente, para ver um falso reflexo !, Para que n?o me diga a verdade, mas simplesmente o que eu n?o quero ouvir ou ver! Para isso, n?o preciso me olhar, e o pior de tudo å que, se eu continuar me olhando, serei cada vez mais senhor.
De certeza que as entradas jà come?aram a aparecer, esses sulcos se aprofundaram como feridas na terra v?o se formando cada vez mais profundos?
Assim que eu decidi n?o me olhar mais no espelho e seguir o meu caminho sem me preocupar com o que os outros dissessem de mim, o que å que pode saber uma crian?a da vida?, certeza que n?o me viu bem!
Minha peregrina??o pelo mundo me levou a conhecer todos os tipos de pessoas e condi??es, o que me enriqueceu bastante deixando para tràs meus preconceitos sobre cor, ra?a ou religi?o.
Apesar de tudo, ele sentia um respeito especial pelos idosos que usavam barbas brancas, pois irradiavam uma sensa??o de paz e tranquilidade comparàvel ? de uma garota quando olha para a m?e, um olhar t?o limpo e afetuoso que atravessa a alma.
Alåm disso, esses idosos, por causa de seus anos ou do quanto viram ou ouviram, tendem a ser bastante sàbios em rela??o a suas opini?es; portanto, em muitas aldeias s?o considerados os mais adequados para tomar decis?es ou para resolver as disputas e problemas que surgem entre os vizinhos.
E agora, eu estou me tornando um homem sàbio, ao menos isso å o que prev? esse ramal de pequenos cabelos sem cor, que parecem querer expulsar ao resto de cor castanha.
Å provàvel que seja hora de assumir minha condi??o, que os anos e principalmente as experi?ncias me tornem uma pessoa mais preparada para …, preparada para o qu??, Para julgar quem està certo em um caso de distribui??o de heran?a entre irm?os ?, o que fazer com um casal de adolescentes que decidem fugir para morar juntos, apesar da proibi??o expressa das duas fam?lias? ou resolver problemas de distribui??o de alimentos quando a seca ocorre ?, por isso n?o me considero nada sàbio, apenas por uma coisa me considero adequado para esta performance e å contar histîrias.
Nas minhas viagens, pude ver, ouvir e sentir uma infinidade de sensa??es, vivenciei mil e uma aventuras, compartilhei com outras pessoas os seus segredos mais ?ntimos e profundos, e cheguei aonde poucos haviam pisado antes. Alguns podem considerar-me um andarilho ou um aventureiro, mas tudo isto me permitiu ir a qualquer pra?a da aldeia e contar as minhas aventuras e desventuras aos mais novos, que vibram ao som das minhas palavras, com os olhos bem abertos e em alguns casos atå ?s suas bocas.
O mais emocionante å ver como, quando vou para o meio da narra??o e quero cortar porque estou atrasado ou porque come?a a esfriar, essas crian?as me pedem e quase imploram para terminar de contar a histîria e o fazem com tanta ?nsia que eu n?o posso negar.
?s vezes fiquei em um lugar por vàrias semanas e, pouco depois de chegar, me foi atribu?da a tarefa de entreter as noites ? luz da vela, para contar-lhes o que aconteceu a milhares de quil?metros de dist?ncia, em terras estranhas onde predominam aventuras incr?veis que ?s vezes se confundem com a imagina??o.
N?o hà prazer maior do que compartilhar algo do que foi vivido com outras pessoas, e elas agradecem com esse sil?ncio e esse olhar enquanto voc? o narra. Hà aqueles que me disseram que eu hipnotizo o meu p?blico e å por isso que eles s?o t?o fiåis e gratos, mas eu n?o conhe?o nenhuma arte desse estilo, eu sî me dedico ao que eu sei, ao que eu tenho visto e ouvido em primeira m?o ou ao que me disseram sobre outros lugares.
Em alguns momentos surpreendem-me as minhas prîprias palavras, porque elas fluem de tal forma que surgem lugares quase màgicos, adornados com detalhes m?ltiplos e marcantes, onde as personagens est?o t?o vivas que quase se podem ver ali ao meu lado.
O desenvolvimento das histîrias ?s vezes me custa, porque å um peda?o da minha vida, ?s vezes å sobre aventuras e fortuna que me lembro com carinho e gosto de compartilhà-la, mas em outras å mais amargo que o fel, acontecimentos terr?veis que tive a infelicidade de testemunhar, mas que expresso da mesma maneira para que as novas gera??es, essas crian?as de olhos angelicais aprendam sobre o que se pode esperar da condi??o humana.
N?o tento ser professor nem sequer transmitir valores a outros, sî conto o que vivi em primeira m?o ou o que me disseram pessoalmente, mas considero importante vesti-lo com as minhas prîprias ideias e pensamentos que amadureci ao longo do tempo, caso alguåm o considere ?til, embora suponha que no final da ?nica coisa de que se lembrarà å da maravilhosa histîria que alguåm que passou pela aldeia contou uma vez, N?o quero, simplesmente, ser suficientemente sensato para n?o me envolver em qualquer disputa em que tenha de decidir sobre a resolu??o de um conflito, porque n?o quero assumir a responsabilidade de determinar a quem correspondem alguns bens ou qual å o castigo a administrar a alguåm.
Para mim, com o meu humilde trabalho de conta??o de histîrias eu tenho o suficiente, me saiam mais ou menos cabelos brancos acompanhadas de rugas que cicatrizes na pele que torna-se cada vez mais dif?cil disfar?ar a minha idade. Para dizer a verdade, as histîrias que contei, e que tanta devo??o e entusiasmo suscitaram entre os mais jovens, foi uma espåcie de histîria vivida e um toque de imagina??o que a adornou para tornà-la quase uma fantasia, quando na realidade guardei em minhas palavras uma multid?o de ensinamentos que eu tinha adquirido ao longo de minha vida.
Quando comecei, pensei que seria fàcil, simplesmente contar a histîria uma e outra vez, melhora-la um pouco em cada ocasi?o e nada mais, mas para mim e para os meus pequenos espectadores n?o era suficiente e assim comecei a contar todas as histîrias que conhecia, come?ando pelas que tinha ouvido da minha prîpria m?e quando era pequeno, continuando com as de outros contadores que encontrei no caminho e com quem partilhei experi?ncias e episîdios, atå inventei muitas delas, mas logo depois, me vi vazio novamente.
Era como se tudo que contasse, n?o tivesse nenhuma import?ncia, como se aquilo fosse apenas uma repeti??o de palavras sem sentido e que apenas emocionava a meu p?blico àvido de novas e inspiradoras histîrias. Por isso, e devido ao sucesso limitado do que estava dizendo, deixei por um tempo e me dediquei a percorrer lugares diferentes, simplesmente para experimentar a vida e conhecer algo mais sobre esse vasto planeta que deixa pequena a imagina??o mais fantasiosa.
Com uma infinidade de tons e cores, sons e cheiros, nem mesmo alguåm t?o dotado de memîria como eu, era capaz de guardar tudo dentro de si, para poder lembrà-lo mais tarde, alåm disso, eu n?o entendia por que seria ?til que eu tivesse ido a um lugar ou outro, que eu tivesse falado com tal e tal pessoa ou que uma ou outra histîria tivesse acontecido comigo mas eu estava motivado e impelido a continuar com aquela estranha peregrina??o a lugar nenhum, acumulando no meu ser as in?meras experi?ncias e tentando manter os detalhes mais relevantes, porque muitos deles escapavam-me os mais relevantes detalhes.
Foi um longo caminho e tambåm muito dif?cil, n?o sî porque me levava a lugares que nunca imaginei chegar, mas porque o n?o saber o fim daqueles viagens me desconcertava. Era claro que o que eu estava vivendo agora n?o podia ser apagado por ninguåm, sî o tempo e a memîria que enfraquece com o passar dos dias, meses e anos, mas sî isso, parecia muito pouco e, alåm disso, o que dizer da minha profiss?o de contador de histîrias?
?s vezes me dava vontade de come?ar uma breve histîria quando visse um menino preocupado ou chorando na rua ou no parque, mas reprimiria meus impulsos, pois n?o estava seguro de que lhe agradava o que eu iria contar. Falei sobre isso com algumas pessoas, que me disseram como era importante saber o que dizer e n?o apenas falar por falar, sem outro sentido sen?o preencher as palavras juntando-as umas ?s outras, mas sem qualquer conte?do.
Tinham-me contado algo sobre a vantagem de copiar outros que tinham enfrentado o meu prîprio dilema e o tinham superado, por isso aconselharam-me a copiar as suas histîrias e a repeti-las vezes sem conta, embora eu estivesse por vàrias vezes prestes a faz?-lo, nunca consegui tentar.
Primeiro, porque n?o me parecia cheio desse entusiasmo que se tem de transmitir aos pequenos e que eles logo captam e apreciam com um belo sorriso e uns grandes olhos, mostra de sua aten??o.
Ent?o, porque numa ocasi?o em que pensei que era o momento certo, vi como outra pessoa contava exatamente a mesma histîria, aquela que com tanto esfor?o tive dificuldade em aprender, n?o pela minha falta de memîria, mas porque parecia quase sacrilågio roubar as palavras de outra pessoa para assumi-las como suas, e aquela pessoa do outro lado da rua estava narrando letra por letra, cada uma das palavras daquela histîria.
Minha frustra??o foi tal, que n?o pude ficar para verificar se o final da narrativa coincidia com o que conhecia. Eu n?o queria resignar-me a fazer o mesmo que aquele outro, roubar os sonhos dos outros e usà-los em seu benef?cio. Apesar de que o p?blico parecia n?o se importar muito a autoria do conto, jà que se deliciavam com isso, a mim me parecia uma ofensa para a profiss?o.
Desde que me vi obrigado a deixar a pràtica da medicina, melhor dito, for?ado, tive muito cuidado de n?o repetir o mesmo erro nas profiss?es que desenvolvi.
Tenho tentado vàrios empregos, mas nenhum deles me preencheu o suficiente, nem consegui o efeito desejado nos meus ouvintes. Atå que por acaso me deparei com esta profiss?o, t?o nobre e antiga como a dos trovadores, que narravam as fa?anhas e sucessos dos grandes senhores, das narrativas åpicas histîricas das batalhas e lutas, mais prîximas do mundo dos sonhos e da imagina??o do que da realidade dos acontecimentos, mas que deslumbravam e entusiasmavam adultos e crian?as ao mesmo tempo que as entretinham.
Uma profiss?o t?o digna como a do menestrel, embora mais prîxima a do bobo da corte ou do palha?o atual, que busca em surpresa e confus?o a maneira de entreter e surpreender os espectadores, que as crian?as mais cr?ticas se tornam, desfrutando apenas do que realmente as excita e rapidamente chato se algo n?o as preencher. Ao contràrio dos trabalhadores do circo e do show, o trabalho do contador de histîrias n?o å t?o visual, pois dificilmente usamos ferramentas como tambores, trompetes ou outros aparelhos que surpreendem e agradam aos pequenos.
A melodia da nossa voz, a mudan?a de tonalidade, a habilidade de guià-los atravås do mundo da imagina??o, transportà-los para lugares maravilhosos sem que tenham sa?do do lugar, a intriga, o mistårio, o suspense s?o as ferramentas de uma profiss?o t?o antiga quanto o ser humano. A forma de transmitir o conhecimento sempre foi atravås de histîrias, narrativas que aconteceu, de nossa prîpria experi?ncia ou de outros… Histîrias faladas ou escritas que foram transmitidas atravås de gera??es e que de uma forma ou de outra nos condicionam na forma como vemos e compreendemos a nossa realidade e mesmo nos limites dela. Um povo sem histîria å um povo morto, sem passado e, claro, sem futuro.
Todas as m?es instintivamente contam histîrias aos seus filhos, para acalmà-los, mas tambåm para educà-los e ensinà-los. Os mais velhos, seja pelos seus anos acumulados ou pela sua experi?ncia de vida, sentem a necessidade de transmitir o que sabem ?s gera??es mais jovens, ainda que estas, por vezes, n?o estejam dispostas a sentar-se e a escutar. Jovens loucos que raramente se surpreendem e riem com a inoc?ncia de uma crian?a, sempre tentando atingir metas fora de alcance, com sonhos que nunca vir?o, ficando frustrados e sendo infelizes por querer o que n?o å deles. Jovens que perderam a capacidade de sonhar com o imposs?vel e o fantàstico, de estar diante de um campo de flores e imaginà-lo cheio de vida de outras åpocas. Eles, aqueles que mais poderiam servir os contos e histîrias s?o os que menos atendem, e mais esquecem.
Por outro lado, os pequenos, que sî querem brincar e dar-lhes um monte de carinho, deixam o que est?o fazendo para ouvir uma boa histîria bem contada, e parece que suas pequenas cabe?as gravam tudo, porque se alguns dias depois voc? contar novamente, eles reconhecem e n?o deixam voc? alterà-la da maneira que voc? disse inicialmente.
Quem me teria dito isso, que no final eu abandonaria o que era o meu sonho? Talvez nem isso fosse, eu apenas segui uma decis?o que eu tinha tomado em um momento, sem parar para pensar se era isso que eu queria ou n?o.
Anos e anos investidos em estudar e progredir na minha carreira, n?o sabendo se aquilo me satisfazia e preenchia, talvez fosse a falta de tempo, por isso eu n?o me questionei ou talvez o medo de descobrir que realmente, em algum ponto do caminho, tinha perdido o caminho.
Å verdade que mantinha a minha decis?o, mas ela havia mudado tanto como a que eu escolhi. Eu pensei que seria uma maneira de ajudar os outros, resolver seus problemas, salvar suas vidas quando necessàrio, mas tudo era t?o tåcnico, t?o estabelecido que, no final, eu sî tinha o equipamento necessàrio e a coopera??o de outros profissionais, como enfermeiros N?o consegui realizar a menor cura.
Pode ser chamado de profissionaliza??o ou talvez especializa??o, mas isso me fez perder o senso do que queria, ent?o entrei nesses estudos, pelos quais passei tanto tempo.
E depois aconteceu aquilo que, inesperadamente, foi catastrîfico, pelo menos foi assim que eu o vivi, um fato fortuito daqueles que acontecem uma vez na vida, embora alguns tenham a sorte de nunca o viver.
Um daqueles que frustram seus planos futuros e mudam sua vida, deixando o passado como um sonho vulgar de algo que n?o vai voltar, n?o importa o quanto voc? tente. Eu tinha certeza de que n?o tinha sido minha culpa, pensando friamente, que ninguåm era responsàvel pelo que aconteceu ou por seu resultado fatal, mas isso n?o confortou ninguåm nem acalmou o desejo de vingan?a de familiares e amigos.
Qualquer erro pode ser cometido por qualquer pessoa, mas quando se trata de alguåm prîximo, torna-se intoleràvel e requer a aplica??o da justi?a com toda a sua for?a, mas o que eu tinha que viver n?o era justi?a, mas vingan?a, a mais dura e amarga. a que eu poderia ter sido submetido.
Nem mesmo por todos os anos que se passaram, eu pude apagar a marca indelåvel que me causou aquele pequeno castigo. Mais do que purgar os meus erros, um grande ultraje foi cometido sobre a minha pessoa, mas isso n?o parecia importar para ninguåm agora.
Alguns, cegos pelo desejo de vingan?a, outros, escondendo o seu envolvimento nos acontecimentos e, portanto, a sua responsabilidade, e os mais afastados do caso, pela pregui?a e pela inconsidera??o.
Voc? sabe aquela frase que diz “Da àrvore ca?da todos fazem lenha”, porque eu tive que viver amargamente aquele ditado, e todos os parentes e amigos, que sempre me apoiaram e em quem eu confiei nos momentos dif?ceis da minha vida, estavam desanimados, e esqueceram a minha exist?ncia, como se eu fosse uma praga ou da casta mais baixa da ?ndia, os intocàveis.
Aqueles que eu pensava que eram meus amigos, por todas as coisas boas que t?nhamos apreciado, desapareceriam assim que me viam, eu nem sequer tinha tempo de lhes contar a minha situa??o para pedir ajuda, em vez disso eles atravessavam para a cal?ada oposta assim que notavam a minha caminhada lenta e cabisbaixa.
Provavelmente abusei de sua bondade nos primeiros dias ou semanas quando contei meus problemas a quem quisesse ouvir, mas depois acho que sua rea??o foi exagerada, embora n?o tenha tido o menor apoio de ninguåm, exceto o conforto fugaz de um sorriso falso e um tapinha nas costas, pois me disseram que tudo passaria com o tempo, mas os dias passaram e isso n?o foi resolvido positivamente.
Alåm disso, penso que com o passar das horas a minha situa??o piorou, uma vez que n?o sî n?o consegui nenhum colaborador e defensor, como o n?mero dos meus detratores e acusadores aumentou. Numa espåcie de histeria coletiva, as cr?ticas ?s minhas a??es tornaram-se contagiosas, como se tivessem sido premeditadas, um ato vil de uma pessoa sem alma.
Nada poderia estar mais longe da verdade, mas essas pessoas n?o queriam saber o que realmente aconteceu, nem as circunst?ncias que o causaram, apenas queriam vingan?a, impulsionadas pela sua dor e por algum advogado inteligente que viu o negîcio de uma sî vez, aproveitando-se do sofrimento dos outros.
Ninguåm sabia que as testemunhas que testemunharam durante o julgamento se contradiziam em seus comentàrios, nem o juiz parecia perceber que, quando lhe fizeram uma pergunta, rapidamente olharam para o advogado da acusa??o para obter alguma indica??o de como eles deveriam responder.
As pessoas que n?o tinham estado là agora pareciam ter muito a dizer, e aqueles que estavam presentes nunca foram ouvidos.
O advogado de acusa??o argumentou que n?o era necessàrio ouvir mais testemunhas, e o advogado de defesa argumentou que lhe tinha sido imposs?vel localizar alguma.
Como se fosse t?o dif?cil, bastava pegar no telefone e ligar a todos os da lista, um a um, e pronto, mas parece-me que alguåm n?o queria que fosse feito e o julgamento, longe de ser tal, transformou-se numa pantomima, patrocinada pela morbidez do espectàculo que minuto a minuto as c?maras ao vivo apanhavam
Aqueles que me julgaram publicamente e me condenaram antes mesmo do julgamento, tantos encontros, programas especiais e debates sobre o meu caso, nos quais todos tomavam como certa a veracidade dos fatos narrados pelo advogado acusador, ninguåm tinha a menor d?vida da minha culpa, mesmo meses antes do in?cio do julgamento.
Eles me compararam aos maiores inimigos da histîria p?blica, me acusaram de buscar meu prîprio benef?cio ?s custas da sa?de de outros, n?o profissional, arrogante e vaidoso, tantos apelos que acho dif?cil lembrar de todos.
Dia apîs dia, noite apîs noite, a m?dia estava determinada a que meu caso n?o permanecesse uma historinha e o divulgavam repetidamente atå que o julgamento fosse realizado.
N?o havia lugar naquela sala, todos os jornalistas que podiam ser acreditados estavam lotados no fundo da sala como se fossem um bando de c?es de ca?a esperando para recolher os restos do que restasse de mim.
O julgamento foi realizado com muitas pausas, pois os prîprios jornalistas e repîrteres, e atå mesmo as c?meras, ocasionalmente me interrompiam e repreendiam, apoiando os depoimentos que me deixavam em um lugar ruim.
Tanto que o juiz teve que pedir vàrias vezes uma suspens?o, para parar o julgamento para chamar a imprensa ? ordem, mas a imprensa era surda e continuou com as suas cr?ticas mais àcidas.
Mais do que um julgamento, foi um linchamento p?blico, onde era mais importante ser aquele que exagerava e dava detalhes mais esquisitos sobre minha vida do que sobre o que aconteceu, que era o que era realmente importante e porque eles estavam là.
N?o houve muito tempo para esperar pela senten?a, embora os dias fossem eternos, e a imprensa a partir do momento apîs o final do julgamento me dava como se eu tivesse sido condenado ? pena màxima.
Felizmente, o juiz foi benevolente, talvez motivado pela compaix?o que devo ter despertado nele, quando viu o circo midiàtico clamando pelo meu sangue, ou porque ele realmente percebeu que isso n?o era do interesse da justi?a, mas sim para dar um espetàculo.
Em qualquer caso, a senten?a n?o me foi favoràvel, mas deixou clara a minha absolvi??o no caso, embora porque eu estava nessa circunst?ncia eu fosse especialmente responsàvel quando o meu treino mådico me obrigou a prestar ajuda e assist?ncia independentemente da minha condi??o.
O resto, foi alimentado pela m?dia que exagerou atå a ?ltima v?rgula do juiz onde os detalhes do que segundo o promotor aconteceu foram coletados, sem dar a m?nima considera??o, nem uma ?nica palavra nos milhares de artigos ou um minuto nas centenas de programas de comentàrios, para explicar a vers?o da defesa, da minha defesa, da minha vers?o.
Embora na realidade eu pense que teria ficado melhor se eu tivesse me defendido sozinho, jà que a incompet?ncia do advogado nomeado pelo tribunal era tal que atå o juiz ficou impressionado com a falta de consist?ncia nas suas palavras e com a dispers?o na sua argumenta??o.
” D? tempo ao tempo”, ele me disse, tentando incentivar, na esperan?a de que em algum momento, aquele jovem estudante recåm formado, que apenas estava estagiando em uma pequena firma de advocacia de uma cidade tivesse uma genialidade com a qual pudesse endossar os muitos comentàrios precisos da acusa??o.
Essa foi uma fase dif?cil em minha vida, que n?o recomendo para ninguåm, n?o basta a humilha??o que me levou a ver-me em tal circunst?ncia, mas a press?o a que fui submetido, perdendo meu trabalho, meus amigos e, claro, minha fam?lia.
Uma mulher que n?o suportou ser o motivo de chacota das esposas de meus colegas, que preferia n?o sair para que a vissem no supermercado e lhe pudessem fazer algum comentàrio mordaz disfar?ado de simples gra?a.
Um belo dia, sem uma palavra, ele pegou nossos filhos e os mandou para a casa da sua m?e para evitar que fossem zoados na escola e que fizessem comentàrios dolorosos mais apropriados para adultos do que para simples crian?as, mas tambåm contavam as mentiras que viam na televis?o ou ouviam de seus pais sobre o que tinha acontecido.
Isso foi o mais doloroso de perder, pois o resto, pode-se recuperar com maior ou menor esfor?o, mas a minha prîpria fam?lia. Tanto quanto sofremos e sofremos muito para chegar onde estàvamos, tantas promessas feitas e palavras de amor compartilhadas e quanto mais preciso, vai e me rejeita.
Nunca quis saber o que realmente aconteceu, nem concordou em ser testemunha da defesa, de minha prîpria defesa, com o que poderia ter esclarecido alguns pontos importantes, mas ela n?o queria enfrentar a imprensa, nem ser objeto de escàrnio, e deixou que eu levasse todo o protagonismo, sem sequer dirigir-me a palavra.
Desde que tinha come?ado tudo isso, apenas me deu um olhar acusativo, e nem uma sî palavra. Nos primeiros dias, enquanto eu esperava pelo julgamento, a tens?o dentro de casa podia ser mastigada, ela parecia muito mais nervosa do que eu, e sobretudo de muito mau humor, como nunca a tinha visto antes.
Uma vez mais, ela me pediu que me declarasse culpado e aceitasse minha senten?a, a qual eu recusei, reiterando minha inoc?ncia, mas ela n?o ficou contente com minha vers?o e preferiu acreditar na m?dia que acamparam dia e noite em frente ao jardim de casa, esperando por alguma imagem indiscreta, capturada por qualquer janela ou buraco nos quartos.
Como se isso n?o fosse suficiente, agora t?nhamos que nos esconder dentro de nossa casa sem deixar uma ?nica fenda na parede, caso houvesse uma c?mera e ela captasse o que viria a ser a imagem da noite, onde eu poderia gozar da minha aparente tranq?ilidade, mas aquela for?a inicial dela desapareceu, atå que finalmente ela chamou a pol?cia para acompanhà-la para longe deles e, claro, de mim.
Foi a ?ltima vez que a vi, protegida por dois policiais que a ajudavam com suas malas, enquanto uma nuvem de flashes a esperava quando ela abriu a porta.
Mesmo durante o julgamento eu n?o tive oportunidade de me encontrar com ela, nem mesmo quando fui considerado inocente e mesmo assim esperei pacientemente pelo seu telefonema, minuto apîs minuto, hora apîs hora, dia apîs dia, eu tinha tantas emo??es e sentimentos contidos que eu queria compartilhar com ela, como eu estava acostumado a fazer.
Desde que a conheci sempre contei com ela, com a cren?a de que se fosse rec?proca a rela??o iria correr bem, sem meias medidas ou meias verdades. Toda a verdade, nua e crua.
O que no in?cio nos criou alguns problemas para vivermos juntos nos primeiros momentos, foi o nosso v?nculo de firmeza mais tarde. Jà que qualquer problema ou dificuldade, contàvamos em encontrar conforto e for?a no casal, assim como idåias e solu??es para superar esses momentos.
Sempre tinha sido assim e, por isso, t?nhamos conseguido sobreviver e superar in?meras circunst?ncias, algumas dolorosas e outras nem tanto.
A vida de casal se fazia t?o fàcil com este sistema, em que a confian?a era total e absoluta, atå que…, isso n?o o pude contar, a princ?pio, por medo ou vergonha e, em seguida, ela nunca mais me quis ouvir.
Quando vi que a m?dia estava come?ando a deturpar os fatos e distorcer a verdade, tentei me explicar e atå me justificar, mas ela parecia perturbada demais pelo que tinha visto e ouvido, e n?o queria conhecer o meu lado. Embora o que ela dizia ser a verdade do que tinha acontecido era o que ela tinha visto em primeira m?o, o que ela tinha sentido e vivenciado.
Nenhum desses jornalistas, locutores e comentaristas estavam là, apenas se limitavam a preencher minutos em frente ?s c?maras ou espa?os nos jornais, mas nenhum deles sabia o que realmente tinha acontecido, apesar disso ela preferiu acreditar neles do que me ouvir.
Talvez fosse porque lhe omiti o fato, n?o sî os detalhes, mas tudo o que estava relacionado com aquele acontecimento.
Talvez ela se sentisse enganada quando viu que eu tinha quebrado o nosso pacto de confian?a m?tua, mas tudo tinha sido t?o ràpido e fortuito que eu n?o tinha mais for?as para lhe contar, e eu sî desejava que quando eu fosse para a cama tudo fosse esquecido e na manh? seguinte ninguåm tivesse sabido.
Mas nada poderia estar mais longe da verdade, logo depois come?aram a chegar, primeiro ao meu trabalho e depois ? minha casa, aqueles telefonemas irritantes de jornalistas ansiosos por fazer declara??es que, apesar de n?o as receberem, enchiam as suas colunas de mentiras e inven??es num tom depreciativo e gracioso, como se fosse algo que os afetasse pessoalmente, como se fossem moralmente obrigados a me perseguir e linchar por tudo o que aconteceu, e ent?o, quando o juiz me absolveu, ninguåm gastou o menor minuto ou a menor palavra para pegar esse aspecto da senten?a, e å claro que nem uma ?nica pessoa pediu desculpas por tanta dor e dano que causaram a mim e ? minha fam?lia.
Como hienas, eles tinham me perseguido e feito a minha vida de pasto, extraindo atå a ?ltima falha de velhos companheiros, amigos e atå namoradas. A todos foi perguntado, e todos que falaram acrecentavam coisas para eu parecer ainda mais culpado, muitas vezes descrevendo-me como um monstro.
Essas s?o as lembran?as das quais eu estive fugindo durante muito tempo e que ainda tenho as cicatrizes em minha alma.
Eu nunca acreditei que alguåm pudesse ser submetido a um julgamento p?blico paralelo e que isso seria pronunciado muito antes de come?ar na sala de audi?ncias.
Minha vida agora å diferente porque sou diferente, dedicado a trazer ? tona o sorriso dos pequeninos, a despertar a sua curiosidade e admira??o. Tive que mudar muito, o que me custou muito, para chegar onde estou agora, enfrentando o meu futuro, pelo menos å assim que eu me sinto e desejo.
Tantas terras percorridas, tantas cidades visitadas, tantos quil?metros caminhados e eu n?o consegui fugir do meu passado. Mesmo quando fecho os olhos ? noite, vejo aquelas imagens de que me esforcei tanto para me livrar, aquelas imagens que me lembram que sou inocente, ainda que tenha tentado apaga-las da minha memîria, n?o consegui.
Muitos of?cios tentei realizar mais tarde, mas em todos eles, mais cedo ou mais tarde, me vi sujeito ? responsabilidade do que estava fazendo, deixando de ser um aprendiz e ninguåm para me supervisionar nas minhas fun??es.
Nesse momento, e n?o sei porqu?, eu ficava bloqueado por me ver sozinho no trabalho, o que quer que fosse, mesmo o mais simples. Eu sentia um p?nico enorme, um suor frio, um tremor nas minhas m?os que n?o conseguia acalmar ou parar.
Eu olhava para todos os lugares e n?o via nada que pudesse ser um problema para mim, nem mesmo uma amea?a, mas n?o importava, havia esta rea??o descontrolada que gradualmente tomava conta do meu ser e me tornava in?til e paralisado.
Eu conhecia os sintomas e a raz?o pela qual isso estava acontecendo, eu tinha tentado evitar atå mesmo tomar medicamentos para reduzir minha ansiedade e em outros casos para aumentar minha atividade, mas nada funcionou, tudo que eu tinha que fazer eu sabia, dar um passo, respirar calmamente, pensar em aspectos positivos, mas nada, n?o havia maneira de conseguir isso.
Fui considerado incapaz para qualquer trabalho, embora n?o estivesse satisfeito com essa qualifica??o. Eu jà tinha sofrido demais com o rîtulo que me foi dado socialmente para me tornar agora um total in?til, incapaz de atender ?s tarefas mais simples sem desmoronar.
Alguns mådicos que consultei disseram-me que poderia ser uma consequ?ncia do stress a que tinha sido submetido nos momentos seguintes a esse tràgico acontecimento, outros que era o resultado de uma vida isolada e sem esperan?a, alguns disseram que era um trauma psicolîgico e outros falaram de um conflito interno entre querer e poder, em todo o caso, eu tinha tentado tudo e nada tinha funcionado.
Atå que, por acaso, uma vez fiz algo que era normal para mim, mas que trouxe ? tona o riso mais sincero que jà tinha ouvido, um menino pequeno riu da minha falta de jeito quando alguns pratos ca?ram, quando eu estava trabalhando ou pelo menos tentava trabalhar como assistente de cozinha.
Umas risadas que contrastaram com o mau humor com que o dono daquele lugar se aproximou de mim, que n?o hesitou em me expulsar do lugar, sem sequer me pagar pelos dias trabalhados, claro que n?o descontou o custo daquela pilha de lou?a suja que eu tinha de lavar e que por um descuido acabaram em peda?os.
Isso me fez pensar, um trabalho como comediante ou talvez um humorista, isso n?o exigia nenhum tipo de responsabilidade ou tarefas complexas nas quais eu pudesse cometer erros, pelo menos era o que eu pensava antes de provar a profiss?o, mas eu tentei e n?o deu certo, as piadas roubadas de outros que eu lembrava dos meus tempos de juventude ou que eu ouvi outros contarem, teve pouca influ?ncia num p?blico exigente, atento a cada ato e gesto que fazia, escrutinando atå o menor movimento, esperando que qualquer palavra ou gesto que fizesse provocasse uma risada sonora, mas isso n?o aconteceu, pelo menos n?o da maneira que se esperava.
Recebi alguns sussurros, algumas risadas e alguns sorrisos, especialmente das senhoras, que estavam mais preocupadas em n?o me ver sofrer là em cima do que em ser uma boa piada.
Eu n?o entendia o que estava acontecendo, porque outros com as mesmas palavras e gestos muito semelhantes estavam enchendo salas, desfeitas em risos, enquanto eu mal conseguia tirar alguns sorrisos delas. As piadas eram as mesmas diante de um p?blico semelhante… Tentei com pessoas mais jovens, mas foram ainda menos divertidas para eles.
Atå que tentei com os pequenos, aqueles que estranhamente exerciam uma estranha influ?ncia, porque me olhavam com aqueles grandes olhos e com tanta aten??o, que por um momento esqueci todas as minhas desgra?as, as cr?ticas sociais e atå quase a persegui??o a que tinha sido submetido, e isso me encheu de uma sensa??o singular. Aqueles olhos limpos e imparciais esperavam algo de mim, algo bom que os entretivesse e os fizesse rir, pelo menos eu pensei assim no in?cio e tentei novamente.
?s vezes as piadas n?o eram muito bem entendidas, outras vezes eu tinha que explicà-las para que entendessem o sentido ir?nico das minhas palavras, outras vezes… muito complexas para aqueles pequenos, que esperavam se divertir sem palavras complicadas com duplo sentido.
Atå que chegou aquele dia màgico, quando entendi que o que aqueles pequenos curiosos queriam era n?o me ver zombando de ninguåm, ou ridicularizando a atua??o de outra pessoa, mas uma pequena histîria para eles por meio de uma histîria, um conto.
No come?o eu resistia diante de uma idåia t?o simples, tantos anos de profiss?o, tantos estudos e especializa??es para acabar contando histîrias.
Um trabalho mais prîprio das m?es principiantes que sî s?o guiados por seus instintos e as suas recorda??es, de quando suas m?es lhes contavam histîrias, mas eu…
Essa ideia era incomum e atå repulsiva para mim, ver-me reduzido a tentar entreter aqueles pequenos com meias verdades, histîrias que sî contavam fantasias onde animais ou plantas podiam falar como pessoas, pareceu-me como engana-los, alimentando uma irrealidade em alguns pequenos que eu n?o conseguia entender como isso poderia beneficia-los.
Å verdade que eu consegui mant?-los calados, entretidos por um momento e que no final eles me agradeciam pedindo-me outra histîria, mas eu n?o via muito sentido em contar o que aconteceu com este ou aquele animal, que estava com outro de sua espåcie e que comentava alguma episîdio.
Å certo que eles ainda n?o tinham idade suficiente para entender muito do meu conhecimento, mas se eu tivesse podido escolher, teria preferido ensinar na universidade. Pelo menos ali as perguntas dos alunos faziam algum sentido tåcnico ou teîrico, mas agora, alåm do fato de que ninguåm interferia atå o final da histîria, tudo era t?o pequenininho, lento, bonito…
Eu n?o gostava muito de algo sobre o que, apesar da minha relut?ncia, estava come?ando a me sair bem.
As piadas explicadas deram lugar a explica??es sem piadas, e logo em seguida seguidas a simples histîrias.
No in?cio eram contos bastante curtos e sem detalhes, preocupados em explicar bem o enredo dos personagens e tentar tornà-los animados. Ent?o, pouco a pouco, os detalhes se tornaram episîdios, introduzindo agora elementos fantàsticos que apareceram e desapareceram da histîria sem nenhuma coer?ncia aparente, mas que a enriqueceram de tal forma que aqueles pequenos ficaram encantados, mas eu ainda tinha um longo caminho a percorrer para descobrir a ess?ncia da histîria e a magia de contà-la bem.
Muitas sess?es de pràtica observando como os outros o faziam e experimentando por conta prîpria tentando diferentes maneiras e aprendendo com os meus erros. Um caminho àrduo e lento que me levou por meio mundo ? procura da melhor histîria, que tanto as crian?as como os adultos gostem, que os possa animar e emocionar, que os deixe sem palavras ao mesmo tempo que permitisse que a sua imagina??o voasse ? solta.
A princ?pio, buscava apenas tentar me superar, cada vez fazer melhor, tentar vencer os outros e a si mesmo nessa profiss?o t?o desgastada e esquecida.
Os adultos ?s vezes zombavam da minha arte, subestimando a dedica??o e prepara??o que ela requer, sem entender a import?ncia do meu papel e que eu enfrento o p?blico mais exigente, as crian?as, embora ?s vezes eu tenha conseguido armar alguma histîria para conserta-la, quando via que ela n?o despertava o menor interesse entre o p?blico, me dei conta de que existiam histîrias ruins e boas histîrias.
A partir da?, comecei a escolher aquelas que eu considerava melhores, embora n?o entendesse qual era o critårio usado por aqueles pequenos ju?zes, que com seus olhos faziam um veredicto agu?ado, indicando se gostavam ou n?o.
Quando come?avam a sussurrar entre si, olhavam para o lado ou eu os via abrindo a boca, levados pelo sono e pelo tådio, eu entendia que n?o estava fazendo bem o meu trabalho.
Aquele p?blico implacàvel dava as suas senten?as sem possibilidade de recurso, e quase n?o admitia uma segunda oportunidade, mas quando gostavam, eram os mais entusiasmados e generosos em aplausos e sorrisos.
Compreendi que tirar um sorriso de uma crian?a era t?o bom como tratar-la de um resfriado ou uma doen?a.
Ele sabia como o sistema imunolîgico, as defesas do corpo contra ataques de doen?as externas, eram ativadas e aumentadas quando as crian?as estavam em um estado emocional adequado ou em um estado de felicidade.
Tudo era t?o simples, apesar de que eles n?o fossem conscientes da mudan?a e que, desta forma, eu estava ajudando eles a serem mais saudàveis e a crescerem fortes.

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Òåêñò ïðåäîñòàâëåí ÎÎÎ «ËèòÐåñ».
Ïðî÷èòàéòå ýòó êíèãó öåëèêîì, êóïèâ ïîëíóþ ëåãàëüíóþ âåðñèþ (https://www.litres.ru/pages/biblio_book/?art=51834922) íà ËèòÐåñ.
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