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Lash
L. G. Castillo
Anjos Caídos #1
Ren achou que havia capturado um ladrãozinho qualquer apenas para descobrir que, escondida sob camadas de sujeira e roupas de menino, estava a pessoa mais desejável e sedutora que ele já tinha visto. Percebendo que ela tinha sido marcada com um símbolo do demônio e parecia ter um desejo mortal, Ren rapidamente decide que a única forma de mantê-la viva é não perdê-la de vista. Se os demônios eram suicidas o bastante para acharem que iam afastá-la dele, Ren lhes mostraria seu próprio desejo mortal.
A mistura com o círculo de roubos realizados por demônios tinha sido fácil… Lacey estava tendo problemas era com a forma de fugir deles quando decidiram matá-la. Quando seu parceiro morre, apenas para dar-lhe uma vantagem inicial, ela não permite o sacrifício dele seja em vão e corre, como se uma horda de demônios a perseguisse… e é o que acontece. Como ela deveria saber que sua rota de fuga iria levá-la bem para o meio de uma guerra de demônios e para os braços de um estranho sexy que era mais poderoso do que seu pior pesadelo? Ren achou que havia capturado um ladrãozinho qualquer apenas para descobrir que, escondida sob camadas de sujeira e roupas de menino, estava a pessoa mais desejável e sedutora que ele já tinha visto. Percebendo que ela tinha sido marcada com um símbolo do demônio e parecia ter um desejo mortal, Ren rapidamente decide que a única forma de mantê-la viva é não perdê-la de vista. Se os demônios eram suicidas o bastante para acharem que iam afastá-la dele, Ren lhes mostraria seu próprio desejo mortal.


Lash

Contents
Livros de L.G. Castillo (#ue4c95fe2-c4b8-5fea-87e6-ed1bb25eacce)
Capítulo 1 (#u5f211306-8278-57c6-9bb4-a59e90f37945)
Capítulo 2 (#ud5439240-3537-52e2-b888-a358561af4d1)
Capítulo 3 (#u02453e6d-7cc7-5900-ae0c-f2c82ce55927)
Capítulo 4 (#u42243e6f-fbd8-5e84-80f5-39ae50d3a01d)
Capítulo 5 (#u450d7803-19c8-558d-9ac0-0346eb657241)
Capítulo 6 (#litres_trial_promo)
Capítulo 7 (#litres_trial_promo)
Capítulo 8 (#litres_trial_promo)
Capítulo 9 (#litres_trial_promo)
Capítulo 10 (#litres_trial_promo)
Capítulo 11 (#litres_trial_promo)
Capítulo 12 (#litres_trial_promo)
Capítulo 13 (#litres_trial_promo)
Capítulo 14 (#litres_trial_promo)
Capítulo 15 (#litres_trial_promo)
Capítulo 16 (#litres_trial_promo)
Capítulo 17 (#litres_trial_promo)
Capítulo 18 (#litres_trial_promo)
Capítulo 19 (#litres_trial_promo)
Capítulo 20 (#litres_trial_promo)
Capítulo 21 (#litres_trial_promo)
Capítulo 22 (#litres_trial_promo)
Capítulo 23 (#litres_trial_promo)
Capítulo 24 (#litres_trial_promo)
Copyright © 2013 por L.G Castillo.
Todos os direitos reservados.
Nenhuma parte desta publicação pode ser reproduzida, distribuída ou transmitida de qualquer forma ou por qualquer meio, incluindo fotocópia, gravação ou outros métodos eletrônicos ou mecânicos, sem a permissão prévia por escrito do autor, exceto no caso de breves citações incorporadas em resenhas críticas e outros usos não comerciais permitidos pela lei de direitos autorais.
Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens, lugares e incidentes são produtos da imaginação do autor. Lugares e nome públicos são usados com propósitos de ambientação. Qualquer semelhança com pessoas reais, vivas ou mortas ou negócios, empresas, eventos, instituições, ou locais é completamente coincidência.
Design de capa: Danielle @ Coffee and Characters (http://www.coffeeandcharacters.com/)

Livros de L.G. Castillo
Série dos Anjos Caídos
Lash (Anjos Caídos #1) (http://smarturl.it/lash-br)
Após a Queda (Anjos Caídos #2) (http://smarturl.it/AnjosCaidos2)
Antes da Queda (Anjos Caídos #3) (http://smarturl.it/AnjosCaidos3)
Jeremy (Anjos Caídos #4) (http://smarturl.it/AnjosCaidos4)
Anjo de Ouro (Anjos Caídos #5) (http://smarturl.it/AnjosCaidos5)
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Versão em Inglês
CONTEMPORARY ROMANCE
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Strong & Wilde (Texas Wild Hearts #1) (https://books2read.com/StrongWildeNovel)
Secrets & Surrender (Texas Wild Hearts #2) (https://books2read.com/SecretsSurrenderNovel)
Your Gravity (https://books2read.com/YourGravityNovel)
PARANORMAL ROMANCE
Lash (Broken Angel #1) (https://books2read.com/LASH)
After the Fall (Broken Angel #2) (http://books2read.com/AftertheFall)
Before the Fall (Broken Angel #3) (https://books2read.com/BeforeTheFall)
Jeremy (Broken Angel #4) (https://books2read.com/JeremyBrokenAngel4)
Golden Angel (Broken Angel #5) (https://books2read.com/GoldenAngel)
Archangel’s Fire (https://books2read.com/ArchangelsFire)
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1
Lash olhava confuso para o quadro de chegadas, seus olhos cor de avelã examinando a lista de voos entrando e saindo do aeroporto de Houston.
— 1724. 1724 — ele murmurou. Números de voos, cidades e portões apareciam enquanto as mudanças eram feitas no portão de chegada. — Droga. Como se lê essa coisa?
Ele passou a mão pelo cabelo escuro com frustração. Um serafim deveria ser capaz de encontrar algo tão simples quanto o portão em que chega sua atribuição de trabalho.
Lash suspirou enquanto olhava para a informação que a Arcanjo Gabrielle, sua supervisora direta, deu a ele. Só ele para ter a sorte de ser atribuído para a única pessoa que se deleitava com a sua miséria. Ele não descartara a possibilidade de ela ter lhe dado intencionalmente as informações erradas do voo para fazê-lo correr no último minuto para encontrar a sua atribuição.
— Javier Duran, oito anos. Voo 1724, chegando às 12h05 — ele leu. Virou o cartão e olhou para a foto do menino com pele de um tom claro de café, bochechas rechonchudas e grandes olhos castanhos.
— Onde está o seu avião, pequenino? — Ele olhou novamente, e os números "1724" apareceram na tela.
— Finalmente. — Ele memorizou o número do portão e atravessou a agitada multidão no aeroporto.
— O que? Eu não posso te ouvir? — Lash ouviu uma jovem gritar no telefone público. — Não, o avião dele ainda não pousou. Deveria estar aqui em alguns...
Ele se virou para olhar a mulher que parou no meio da frase, curiosa para ver o que aconteceu. A mulher olhou através dos óculos cor de rosa diretamente para ele.
Lash saltou de surpresa. Era como se ela pudesse vê-lo. A maioria dos humanos não podia quando ele tomava sua forma de anjo - exceto por crianças pequenas ou animais, mas mesmo isso era raro. Quando um adulto conseguia vislumbrá-lo, ele muitas vezes descartava isso como uma invenção de sua imaginação.
— Anita, qué paso? — perguntou a voz do outro lado da linha. — O que aconteceu?
— Espere um minuto. — Anita tirou os óculos e limpou as lentes com sua blusa floral de poliéster.
Lash ficou imóvel, esperando para ver se ela diria algo sobre sua presença. Anita colocou os óculos de volta. Olhos castanhos olharam em sua direção novamente. Depois de um momento, ela balançou a cabeça e continuou sua conversa.
— Não importa, eu pensei que tinha visto alguma coisa — disse ela quando voltou sua atenção para o interlocutor. — Me dê a informação novamente, preciso anotar. — Ela enfiou a mão na bolsa e tirou um pedaço de papel. Embalagens de doces e chiclete caíram no tapete junto com uma caneta preta. — Onde está minha caneta? Não consigo encontrar nada nesta bolsa.
— Faça uma oração para São Longuinho — disse a voz ao telefone.
— Boa ideia. — Anita fechou os olhos. — São Longuinho, São Longuinho. Por favor, me ajude a achar o que eu perdi e não consigo encontrar. Ajude-me a encontrar minha caneta para poder escrever as informações que Gloria deveria ter me dado esta manhã antes que meu filho de oito anos subisse sozinho no avião. E enquanto você está nisso, você pode pedir ao Senhor para perdoar Gloria por seu esquecimento? Ela tem que aturar o meu ex-marido, e só o Senhor sabe como esse homem é imprestável - especialmente quando se trata de lavar a roupa de baixo.
— É oração suficiente — retrucou Gloria do outro lado da linha.
Lash riu. Não havia São Longuinho ‒ pelo menos não no aeroporto. Ele pegou a caneta e colocou-a na borda da prateleira do telefone público.
Anita estremeceu. — Dios mío, senti um calafrio. Eles deixam o ar muito frio aqui. Eles deveriam... — Seus olhos se arregalaram quando ela viu a caneta. — Como que isso foi parar aqui?
Anita se virou e Lash prendeu a respiração. Ela estava nariz-a-nariz com ele, tão perto que ele podia sentir o hálito de menta e ver uma mancha de batom vermelho no dente da frente. Ela respirou fundo, fechou os olhos e sorriu. — Gracias, São Longuinho. Me sinto abençoada. — E deu os três pulinhos para o santo.
Lash piscou com espanto. Já fazia muito tempo desde que se deparara com um humano como ela. Ele não conhecia a minúscula mulher de cabelos escuros, mas uma aura de paz a cercava. Era como se soubesse que estavam cuidando dela.
Ele olhou para o relógio e deixou Anita conversando com sua amiga. O avião do garoto estava programado para pousar em breve. Enquanto corria pelo corredor, ele se perguntou se sua tarefa era o menino de Anita.
Quando chegou ao portão, olhou pela grande janela para o espaço vazio onde deveria estar o avião. Em vez disso, Jeremy, seu melhor amigo, estava no asfalto. Ele estava vestido impecavelmente, parecendo mais um modelo de capa de uma revista GQ do que o Arcanjo da Morte. Seus cabelos dourados, escovados do rosto, brilhavam sob o sol do Texas. Lash sempre achou estranho que ele se importasse com a sua aparência, considerando que raramente aparecia em sua forma humana. A maioria das pessoas o conhecia apenas pelo seu nome de anjo, Jeremiel, e quando aparecia para eles, era porque estavam morrendo. Jeremy, como Lash, decidiu modernizar seu nome alguns anos atrás. Pena que ele não fez o mesmo com suas roupas. Comparado a Jeremy, Lash parecia o perpétuo rebelde adolescente, preferindo jeans rasgados e camisetas justas.
Lash se perguntou por que Jeremy não mencionou que tinha uma missão em Houston durante o jogo de pôquer da noite anterior. Pela primeira vez desde que começaram a jogar, décadas atrás, Lash estava ganhando, e eles estavam se divertindo muito ‒ fumando charutos e bebendo uísque. Não foi até que Gabrielle apareceu e entregou a Lash a tarefa, que Jeremy ficou estranhamente quieto. Jeremy parecia tão incomumente chateado quando pediu a Lash uma garantia dos seus ganhos, embora Lash não conseguisse pensar em uma única vez onde precisou cobrá-lo. Gabrielle parecia estar de mau humor também. Talvez ele devesse ter reconsiderado o sopro de fumaça que deu diretamente em seu rosto. Ela provavelmente não gostou disso.
Lash estava prestes a se juntar a ele na pista quando Gabrielle apareceu. Ela sussurrou algo no ouvido de Jeremy e seu sorriso sempre presente, congelou. O que quer que ela tenha dito a ele, não poderia ter sido bom.
Ele seguiu o olhar de Jeremy e olhou para o céu sem nuvens. Ao longe, viu uma pequena partícula e, instintivamente, soube que era o vôo 1724. Lash olhou para Jeremy e imaginou se sua tarefa envolvia alguém no mesmo voo.
Jeremy acenou para Gabrielle e, num instante, desapareceu. O pavor atingiu a boca do estômago de Lash quando Gabrielle levantou os braços no ar e girou as mãos delgadas em círculos. Árvores ao redor do aeroporto balançavam enquanto o vento aumentava e nuvens escuras começavam a se formar.
Lash pressionou as palmas das mãos contra o vidro. O que ela estava fazendo? Ele cerrou os dentes, imaginando se ela estava intencionalmente tentando dificultar seu trabalho. Foi-lhe dito para cuidar de Javier e ter certeza de que ele retornasse em segurança para sua mãe. Ela convenientemente esqueceu-se de lhe dizer que o menino estaria em perigo ‒ ou que o perigo seria a própria Gabrielle.
Lash observou enquanto ela continuava a manipular o vento e as nuvens, e o céu que escurecera.
— Parece que uma tempestade está chegando — disse uma mulher sentada na fileira de cadeiras atrás dele.
— O clima do Texas é assim — disse o companheiro masculino ao lado dela. — Um minuto está um dia ensolarado; você pisca e então todo o inferno se solta.
Um estrondo de trovão fez o vidro vibrar sob as mãos de Lash. Ele se afastou quando um fluxo de pedaços de gelo bateu no chão.
— Senhor, tenha misericórdia — disse a mulher enquanto pressionava a mão contra o peito. — Isso foi alto. — Ela olhou pela janela. — Espero que passe em breve. Não queria ser pega lá fora nesta tempestade.
Foi então que Lash soube por que Gabrielle e Jeremy estavam lá e por que ele recebeu essa tarefa. Nem todos os passageiros do voo 1724 iriam pousar em Houston - não vivos.
Ele fechou os olhos e projetou-se no avião. Quando os abriu, estava de pé no corredor ao lado de uma garota bonita. Seu cabelo loiro claro estava enfiado atrás das orelhas, destacando vibrantes olhos azuis. Ela não poderia ter mais de doze anos, mas algo sobre ela, a fez parecer sábia além de seus anos.
Lash olhou pela janela. Um nevoeiro de escuridão cercava o avião. As pessoas sentadas nos bancos perto dele murmuravam freneticamente enquanto olhavam para fora. Eles estavam assustados. Ele rapidamente afastou os sentimentos que ameaçavam borbulhar, precisava se concentrar.
Um choramingo vindo do assento atrás da garota chamou a sua atenção, e ele deu um passo em direção a ela. Sentado no banco estava um menino pequeno, seus pés mal tocando o chão. Javier.
— Mãe, ele está com medo — disse a menina. — Posso ir sentar com ele?
A mulher, uma réplica mais velha da moça bonita, tomou um gole de seu coquetel. — Não, não é seguro. — O avião deu um solavanco, e ela deixou cair a bebida no chão, o líquido âmbar espirrando em seu terno de linho branco. A cor sumiu de seu rosto quando ela agarrou o braço da cadeira. — Meu Deus.
A garota se inclinou para o lado e olhou para o menino. — Mas ele está sozinho.
— Faça o que eu disse, ou terei que contar ao seu pai quando chegarmos em casa — A mulher estalou enquanto limpava as calças com um guardanapo. — O comissário de bordo irá cuidar dele.
Lash observou a garota piscar rapidamente e sentiu um puxão em seu peito enquanto ela enxugava as lágrimas. Ela colocou um olhar determinado em seu rosto antes de voltar sua atenção para o menino.
— Está tudo bem. Shh, não chore. Nós estaremos pousando em breve — disse ela. — Qual o seu nome?
O garotinho olhou para cima. Olhos castanhos emoldurados por longos cílios travados com os dela. Lágrimas cobriam suas bochechas rechonchudas. — Ja-Javier. — Ele fungou e limpou o nariz com as costas da manga da camisa.
— Oi, Javier. Eu sou Jane.
O avião desceu, levantando Javier de seu assento por uma fração de segundo antes que voltasse para baixo. Ele soluçou e Lash se ajoelhou ao seu lado enviando uma onda de calma, esperando que o menino pudesse sentir sua presença.
Javier ofegou para dentro e para fora como se tentasse recuperar o fôlego. Uma mão pálida se estendeu em direção a ele. — Você vai ficar bem, Javier. Não se preocupe. Eu vou segurar sua mão até pousarmos. Ok?
Javier olhou para Jane. Seus cachos negros balançaram quando ele assentiu.
Doeu em Lash quando Javier estendeu a mão e colocou na de Jane. Fazia muito tempo desde que vira alguém agir de maneira tão abnegadamente. Ele olhou ao redor do avião, esperando ver Jeremy. Como ele não estava lá, talvez houvesse esperança para a menina e os outros.
O avião tremeu violentamente e os comissários de bordo correram pelo corredor, ordenando que os passageiros apertassem os cintos de segurança. Eles então correram para seus próprios lugares e se afivelaram.
Houve um estalo alto seguido por um grito de metal se rasgando. Gritos encheram a cabine e máscaras amarelas de oxigênio caíram do teto.
Jane soltou a mão de Javier por um momento para colocar a máscara e ele chorou. Lash se inclinou e sussurrou: — Não tenha medo. Estou aqui com você.
Javier continuou a chorar enquanto Lash pairava sobre ele, olhando para Jane, cujas mãos trêmulas estavam colocando a máscara amarela sobre o rosto. Quando terminou, recostou-se, esticando a mão para Javier. — Coloque a sua máscara — ela gritou.
Javier pegou a mão e olhou para ela com uma expressão vazia. Jane olhou diretamente nos olhos dele e apontou para o plástico amarelo que pairava. — Coloque-o.
Javier assentiu e colocou freneticamente a máscara sobre a cabeça. Houve um estrondo alto, gritos foram engolidos assim que começaram. Os olhos de Javier se arregalaram, Jane se virou para ver o que ele estava olhando e deu um grito estridente. Luz laranja e vermelha refletiam na máscara de Javier, e Lash endureceu. Uma onda de calor bateu em suas costas e ele se preparou para lutar contra o que estava prestes a prejudicar o garoto. Seu estômago se apertou quando uma onda de chamas rolou pelo corredor em direção a eles.


Os passos de Lash ecoaram na Sala das Oferendas, uma ampla sala onde os arcanjos exibiam os presentes que os humanos ofereciam ao Céu ao longo dos séculos. Pinturas e esculturas se alinhavam nas paredes. Ele parou em frente a uma grande caixa de mogno e olhou para uma pequena estatueta, uma figura de Gabrielle, através da vidraça. Seus olhos claros escureceram quando pegou e passou as mãos sobre a pedra lisa. Ele arrancou a cabeça e esmagou-a entre os dedos, transformando-a em pó, então colocou a estatueta na frente e no centro da prateleira e sorriu, sabendo que Gabrielle ficaria furiosa quando visse.
Ele se virou quando a grande porta de carvalho se abriu, e o Arcanjo Raphael entrou na sala, seus solenes olhos azuis pousando em Lash quando se aproximou. — Lahash — Sua voz estava cheia de decepção.
Não era a primeira vez que Raphael escoltava Lash ao Salão do Julgamento, um lugar onde os anjos eram disciplinados por seus erros e julgados se eram dignos de permanecer no céu. Lash nunca se preocupou se alguma vez seria considerado indigno ‒ Raphael sempre cuidava disso.
Olhando para a estatueta sem cabeça, Raphael franziu os lábios, mas não comentou sobre isso. — Michael vai ver você assim que terminar de questionar Gabrielle.
— É Lash — Lash murmurou sob sua respiração. Ele odiava ser chamado por seu nome celestial, mas Raphael, antiquado em seus modos e inflexível em manter tradições, insistia.
Raphael passou a mão pelas ondas loiras de cabelo com frustração. Ele não reconheceu que o havia escutado, mas Lash sabia que ele ouviu. Algumas das vantagens especiais de ser um anjo incluíam visão, audição e força amplificadas - o voo era um bônus adicional.
— Por que você fez isso, Lahash? Gabrielle lhe deu instruções específicas. Tudo o que você tinha que fazer era segui-las.
Que resposta ele poderia dar ao seu mentor, a única pessoa que sempre o defendeu quando decidia seguir o seu próprio caminho? Ele desejou poder dizer a Raphael a verdade. Quando Gabrielle lhe deu instruções para salvar o menino, ele ficou feliz em fazê-lo. Depois de anos ajudando humanos que jogavam suas vidas fora com atividades frívolas, ele achava que pelo menos com as crianças havia esperança. Havia algo sobre crianças, com suas mentes abertas e corações imaculados, que eram tão diferentes dos corações cansados ​​da idade adulta. Salvar o menino foi fácil; deixar a menina de cabelos loiros para o seu destino não foi.
— Gabrielle cometeu um erro. Ela deve ter esquecido que outro jovem estava no avião, então imaginei qual seria o mal de salvar os dois?
— Não houve erro — disse Raphael.
— A menina merecia viver.
— Não cabe a você decidir. Você sabe disso.
— Sim, sim, o Chefe toma as decisões. — Lash acenou para ele e sentou-se em um dos sofás de couro no centro da sala. Ele tentava seguir suas atribuições, mas ultimamente tornava-se mais difícil aceitá-las, mesmo sabendo que Michael e Gabrielle recebiam suas instruções de Deus.
Raphael se sentou em frente a ele e se inclinou. — Lash, você se importa profundamente com os humanos, e é isso que faz de você um grande serafim. Mas você deve aprender a ter controle. Você não pode tomar decisões sem pensar sobre elas.
— Eu sei o que estou fazendo. — Lash afundou no sofá branco e se inclinou para trás, entrelaçando as mãos atrás da cabeça. — Eu não concordo com algumas das decisões tomadas por aqui.
— Você é jovem. Você vai crescer e aprender que as decisões que tomamos são baseadas em muito mais do que aquilo que é colocado diante de nós. — A voz de Raphael ficou severa. — Toda ação tem consequências que devem ser levadas em conta.
— Deixa disso. Ela é uma garotinha. — Lash jogou as mãos para cima. — Eu dei a ela uma chance de crescer e viver sua vida. Qual poderia ser o mal disso?
— Mais do que você sabe.
Lash revirou os olhos e seu rosto ficou sério. — Você deveria tê-la visto, Raphael. Havia algo bom nela que eu não vi em alguém há muito tempo.
— Tenho certeza de que havia, mas você não tem conhecimento do que ela irá se tornar. — Raphael sentou-se e um olhar distante cruzou seus olhos. — Houve uma época em que segui meu coração. Eu me atrevi a desafiar Michael e os outros. — Os olhos de Raphael se abriram, uma expressão triste cruzou seu rosto. — Eu fiz isso a um alto custo.
Lash tinha visto essa expressão algums vezes e se perguntara o que tinha acontecido com Raphael para causar-lhe uma mágoa tão aparente. Ele desejou poder lembrar a primeira vez que o conheceu. Por alguma razão, havia uma lacuna em sua memória. Tudo o que conseguia se lembrar era de acordar uma manhã com Raphael sentado ao seu lado.
Quando Raphael se levantou e caminhou até a porta, Lash seguiu e deu um soco no ombro dele. — Ei, não se preocupe. Eu vou receber uma palmatória como da última vez.
Raphael sacudiu a cabeça. — Algum dia; sua rebeldia irá alcançá-lo.
Ele sorriu. — Hoje, não. Tenho certeza disso.
Ao descerem pelo corredor, um anjo alto e esguio se aproximou deles. Ondas de cabelos louros emolduravam um rosto carrancudo. — Michael está pronto para ver você.
Lash sorriu. — Bom dia para você também, Gabrielle.
Gabrielle estreitou os olhos verdes de gato. — Você não entende as ramificações do que você fez? Ou você simplesmente não se importa?
Ele estava prestes a responder quando Raphael entrou na frente dele. — Não responda a isso. Gabrielle, acredito que é melhor ter essa conversa com Michael. Vamos?
Seus olhos suavizaram quando ela olhou para Raphael e então ficaram gélidos. — Você não pode protegê-lo desta vez. — Ela se virou para Lash, e o olhou com ódio. — Por que você se importa? — Virando-se, ela caminhou em direção ao Salão do Julgamento.
Na porta, ela se afastou e ficou ao lado de Raphael. Quando Lash entrou, piscou para ele, tentando esconder sua crescente ansiedade. Estranho. Em todas as vezes que já esteve em apuros antes, ele nunca ficou ansioso. Algo estava diferente.
— Não se preocupe, Raphael. Eu tenho isso sob controle — disse Lash. Qual a pior coisa que poderiam fazer com ele?

2
Trinta e cinco anos depois
Naomi Duran desligou a moto e sentou-se por um momento observando as crianças da vizinhança jogar basquete. Três garotos correram descendo a rua enquanto duas garotas estavam na calçada, avisando-os sobre os carros que passavam. Ela soltou a alça do capacete e riu.
Ela não podia acreditar que finalmente se formara na faculdade.
Percorrera um longo caminho desde a magricela que estava nos ombros de seu primo Chuy enquanto pregava a cesta de basquete no poste de telefone. A cicatriz em seu joelho e o tapa no traseiro que levou do seu pai valeram totalmente a pena, no entanto. Ela ganhou a aposta contra Lalo Cruz, o melhor amigo de Chuy, e gastou dez dólares em refrigerante Big Red. Ela não podia acreditar que o aro ainda estivesse pendurado no mesmo lugar.
Naomi tirou o capacete e o cabelo escuro caiu sobre o rosto. Eu preciso de um corte de cabelo, ela pensou enquanto afastava a massa emaranhada. A última vez que teve um foi quase dois anos atrás quando sua mãe perdeu o próprio cabelo durante a quimioterapia. Sem hesitar, ela cortou as tranças que estavam na cintura e o usou para fazer uma peruca. Um ano depois, seu cabelo cresceu e sua mãe faleceu. Ela queria cortar o cabelo curto novamente, mas toda vez que ia ao cabeleireiro, isso trazia de volta memórias que não queria lembrar.
Era doloroso pensar em sua mãe e Naomi evitava isso sempre que possível. Ela comprou a motocicleta Ninja 250R usada, depois que sua mãe morreu. A moto vermelha gritava: "Dirija-me!" e ela teve que tê-la. Graças às habilidades mecânicas de Chuy, ele fez a moto funcionar como nova. Só enquanto dirigia era capaz de afastar a memória de sua mãe murchando em sua cama ou seu pai afogando a sua dor no álcool depois que ela morreu.
— O que você está fazendo sentada aqui fora?
Chuy saiu da pequena casa branca, a porta de tela se fechou atrás dele. Ele percorreu um longo caminho desde o garoto magro com acne. Agora está todo musculoso, graças ao seu trabalho na Companhia Cruz de Mudança. Levantar diariamente muitos quilos de mobília o preencheu muito bem, embora Naomi nunca admitiria isso em voz alta. Ele já tinha seu ego acariciado regularmente por várias garotas da vizinhança que se reuniam em torno dele.
— Estou apreciando o silêncio antes de ter que enfrentar a multidão que chamamos de família. — Ela jogou a perna por cima do banco e prendeu o capacete na moto.
— Deixe-me empurrar essa armadilha da morte para você. — Ele se inclinou sobre sua motocicleta e flexionou seus braços musculosos para ela. — Confira minhas armas. Elas ficaram maiores.
Ela revirou os olhos e empurrou-o para longe. — Eca, Chuy. Você precisa de um banho.
— O que está errado? Seu nariz é bom demais para a Eau de Mexicano? Alguns de nós têm que trabalhar para viver. Nem todos nós podemos ser universitários como você. — Chuy sorriu.
Naomi bufou. Ele sempre a provocava quando estava tentando esconder seus verdadeiros sentimentos. Ele era como um irmão mais velho, sempre cuidando dela, especialmente depois que as coisas ficavam difíceis com o seu pai. Às vezes, ela ficava com ciúmes do relacionamento especial entre pai e filho que Chuy e seu pai tinham, mas ela não podia culpar seu pai por tomar Chuy sob sua asa depois que seus próprios pais foram mortos quando ele tinha cinco anos. Sua avó criou Chuy, seus olhos de falcão sempre atentos para que ele não fosse recrutado por nenhuma das gangues da vizinhança. Se Chuy tivesse algum problema, seu pai estava lá para colocá-lo em seu lugar.
— Você poderia ter seu próprio negócio agora, se você não tivesse desistido após o primeiro semestre.
— Você pode me culpar? Como aprender sobre Sócrates ajuda a pagar as contas? — Chuy baixou o suporte.
Ela olhou para ele com cuidado. Era um ponto dolorido para ele, já que queria ficar na faculdade, mas também não podia pagar as mensalidades e sustentar a avó. Na época, papai estava lutando para manter o seu próprio emprego e também não podia ajudar.
— Está bem, está bem. Eu admito. Você é muito inteligente, você sabe disso. — Ela o cutucou no braço. — Eu não conseguiria passar em álgebra sem a sua ajuda.
— Não tão alto. — Chuy olhou em volta nervosamente quando chegaram aos degraus da frente da casa. — Eu tenho uma reputação para proteger.
— Oh, que horror! Eu não quero que ninguém pense que você é inteligente.
Naomi ouviu a música crescendo antes que visse. Os garotos da vizinhança deram um passo para o lado e observaram o mustangue preto virar a esquina. Aros semelhantes a espelhos giravam devagar enquanto o carro descia a rua. Na grade do carro, luzes LED brilhantes contornavam o logotipo do cavalo como um halo branco-azulado.
— Realmente, papai. Depeche Mode? — Naomi perguntou quando o seu pai, Javier Duran, parou o carro na frente dela.
— Você sabe que gosta disso. Você costumava dançar o tempo todo quando era pequena. — Javier tomou-a nos braços e deu-lhe um abraço. — Parabéns, Mijita. Você ficou linda esta manhã com seu chapéu e beca.
— Obrigada, pai. — Naomi adorava quando ele usava o carinhoso termo espanhol para filha.
— Você nos ouviu? Batemos palmas para você. — Javier abriu o porta-malas do carro e tirou uma sacola de compras.
— Sim, pai. Acho que todo mundo ouviu a buzina de Chuy.
— Ei, eu tive que agitar um pouco as coisas — disse Chuy enquanto pegava as sacolas restantes do porta-malas. — Foi tão chato que estávamos caindo no sono.
— Missão cumprida. O chanceler quase teve um ataque do coração. — Naomi foi até a frente do carro e traçou a luz ao redor do cavalo. — Você terminou de instalar as luzes. Ficou bom.
Javier sorriu e deu um tapinha no capô do carro. — Você precisa ver à noite, parece que o cavalo está vindo direto para você.
Ela riu. Fazia muito tempo desde que tinha visto seu pai tão feliz. — Papai, você parece um adolescente.
— A vida é difícil, Mijita. Você tem que aproveitar quanto puder.
— Sim, não podemos todos ser verdadeiros devoradores de livros como você, Naomi — disse Chuy. — Além disso, você tem vinte e dois, não oitenta e dois. Viva um pouco.
Se ela conseguisse. Houve um tempo em que foi capaz de agir de acordo com sua idade. Durante os primeiros dois anos na faculdade, foi para uma série de festas de fraternidade. Tudo mudou durante seu primeiro ano quando sua mãe foi diagnosticada. Ao contrário de outras garotas da idade dela, ela não tinha interesse em namorar, mesmo quando sua mãe a estimulava. Ela tinha a sensação de que sua mãe estava esperando que ela encontrasse alguém em quem pudesse se apoiar uma vez que fosse embora.
Depois que ela morreu, Naomi não teve tempo de chorar porque estava ocupada cuidando de seu perturbado pai. Na verdade, ela queria desistir da faculdade. Se não tivesse prometido a sua mãe que se formaria, teria feito.
Naomi sorriu enquanto Javier e Chuy conversavam animadamente sobre o carro a medida que caminhavam em direção ao quintal. Parecia que as coisas estavam melhorando para todos eles. Algumas semanas atrás, Javier iniciou as reuniões do AA e parou de beber, colocando toda a sua energia em consertar o Mustang com Chuy. Naomi tinha um novo emprego como assistente social no Serviços de Proteção à Criança, que começará daqui a algumas semanas. Com mais dinheiro chegando, ela poderia até mesmo se dar ao luxo de ajudar Chuy com os pagamentos da hipoteca de sua avó.
— Mijita! Você está aqui. Por que você demorou tanto? — A avó de Naomi correu pelas escadas da varanda e envolveu um par de finos braços marrons ao redor dela.
— Ow, Welita. Você está me esmagando — Naomi disse.
Sua avó - ou Welita, como todos a chamavam carinhosamente - era pequena, mas forte. Ela usava o cabelo preto curto, dizendo que estava quente demais para ter qualquer outro comprimento. Anos de trabalho duro, criar seu filho e, em seguida, Chuy, a deixaram com pouco tempo para cuidar de si, especialmente quando se tratava de roupas. Se alguém abrisse o seu armário, eles pensariam que tinham sido transportados de volta no tempo para os anos setenta. Naomi tentou convencer a avó a mudar de poliéster para algodão e até se ofereceu para comprar um novo guarda roupa, mas Welita recusou, dizendo que suas roupas estavam perfeitamente bem e que um dia elas estariam na moda novamente.
— Cómo se dice? — Welita murmurou então estalou os dedos. — Eu lembro. Coloque no ebaie.
— Você quer dizer eBay. Sim, eu posso fazer isso. — Chuy olhou para Naomi com um sorriso maligno. — Ou talvez eu pegue para mim.
— De jeito nenhum! Você não está colocando minha moto no eBay. — Naomi deu um tapa no braço dele. — Eu amo a minha moto.
— Tão parecida com Stacey — resmungou Javier.
— O que? — Naomi olhou para a cerveja que ele segurava e se perguntou se ele tinha cometido um deslize. Ela não queria álcool em sua festa de formatura, ela nunca se importou com essas coisas, mas Chuy insistiu, dizendo que não seria uma festa sem isso. Naomi ficou cética a princípio, mas Chuy prometeu ficar de olho em Javier.
— Sua mãe. Você é tão teimosa quanto ela. Uma vez que colocava algo na cabeça, não havia como impedi-la. — Lágrimas brilhavam em seus olhos, e ele engoliu em seco. — Ela ficaria tão orgulhosa de você hoje.
— Eu sinto falta dela também. — Naomi não podia contar as vezes que desejou que sua mãe estivesse lá para compartilhar o momento com ela. Não percebeu o quanto se parecia com sua mãe até aquela manhã quando colocou o capelo preto de formatura na cabeça, olhou para o espelho e viu a mesma imagem que tinha como papel de parede do celular. A única diferença é que, na foto, cabelos ruivos saíam do chapéu, em vez do cabelo escuro de Naomi.
— Ela adoraria ver você assim, tão crescida. Se apenas a família dela tivesse sido capaz de dirigir para a cerimônia — disse ele.
— Eu tenho toda a família que preciso aqui comigo. — Naomi nunca tinha conhecido a família de sua mãe, exceto através do cartão postal anual com uma foto de todo o clã Hamilton sentado na frente de uma grande árvore de Natal.
Não era segredo que a família Hamilton, uma família abastada da região de Dallas, não aprovava o casamento de sua filha com Javier. Eles devem ter convenientemente esquecido o fato de que, se não fosse pelas habilidades de tutoria de Javier, a filha nunca teria passado nas aulas de ciências. Naomi imaginou que deve ter sido sua chegada inesperada durante o último ano de faculdade de Stacey e o subsequente anúncio de que ela não iria se formar, o que pode ter alienado a família dos Durans.
Naomi colocou um braço ao redor da cintura do pai quando entraram no quintal. Quando dobraram a esquina, trombetas soaram, e ela pulou para trás com a surpresa. — Mariachi? Você me trouxe Mariachis?
— É Mariachi Cascabel — disse Welita com orgulho. — Eles vieram de Laredo. Eles são os melhores.
Lágrimas encheram os olhos de Naomi enquanto sua avó e seu pai sorriam orgulhosos. Ela sabia que uma banda como essa era muito cara e não tinham como pagar. Faz apenas um mês que o pai de Lalo, proprietário da Companhia Cruz de Mudança, ofereceu-se para contratar Javier em tempo parcial para ajudá-lo a administrar o negócio. Quanto à avó, a única renda que recebia era de seus benefícios previdenciários.
— Welita, pai, isso é demais. Você não deveria...
— Sem reclamar. — Welita deu um tapinha na mão de Naomi. — Não se preocupe. Não custou muito. Além disso, todos na vizinhança ajudaram.
Naomi olhou para os vizinhos sentados juntos, conversando, comendo e bebendo. A maioria deles, ela conhecia desde que era uma garotinha - como a família de Lalo, os Cruzes, que se sentaram em uma das mesas de piquenique conversando com alguns de seus parentes em Los Angeles. Os Durans também apareceram com força total, viajando de longe até Laredo apenas para estar lá. As graduações na faculdade eram raras em sua família, e a tocava que eles queriam estar lá com ela para comemorar. — Eu não sei o que dizer.
— Você diz obrigada — disse Chuy quando colocou as sacolas de compras em uma mesa de piquenique próxima.
— Eu sei disso. — Ela beijou Welita e depois seu pai na bochecha. — Muito obrigada.
— Chuy, aqui, cara. Traga a bebida.
Naomi viu quando Lalo esguichou fluido de isqueiro na churrasqueira. Ele limpou uma toalha de papel sobre a testa suada e enfiou nos bolsos. Lalo era um grande fã de camisas havaianas três vezes maior que ele e fajita. Ele era um cara doce e extremamente leal. Uma pessoa poderia confiar nele com qualquer coisa, exceto substâncias inflamáveis.
— Você colocou Lalo no comando do churrasco? Você está maluco? Ele vai queimar toda a vizinhança. — Ela estava prestes a correr para ele quando Welita a deteve.
— Espere um momento. Eu tenho um presente para você — disse Welita.
Chuy protegeu os olhos quando ela enfiou a mão na blusa. — Ugh, Welita. Não faça isso na frente de todos.
— Ay, Ama! Por que você coloca coisas aí dentro? — Javier ficou na frente dela, olhando ao redor do quintal para ver se alguém estava assistindo.
Welita pegou um envelope dobrado. — É o lugar mais seguro que eu conheço.
— Nisso você está certa — disse Chuy.
— Vá ajudar Lalo, pendejo. — Welita o golpeou.
— Não, Lalo! — Chuy lamentou enquanto corria para ele. — Uma lata é suficiente.
— Isto é para você, Mijita. — Welita colocou o envelope branco na mão de Naomi.
— Eu não posso aceitar isso. Você já fez muito. — Naomi tentou colocar o envelope de volta no bolso de sua avó.
— Não, não. Você aceita. É um presente. Você não pode recusar um presente. Seria um insulto.
As mãos de Welita estavam em seus quadris e seus olhos instigando Naomi a desafiá-la. Seria como uma bofetada no rosto da avó se ela não aceitasse o presente. Era uma questão de orgulho que Welita conseguisse juntar a pequena quantia de dinheiro.
Ela se abaixou e beijou sua bochecha. — Gracias, Welita. — De alguma forma, Naomi jurou para si mesma que iria devolvê-lo para ela. Era melhor fazê-lo sem que Welita soubesse disso. Ela era teimosa desse jeito.


Enquanto a noite prosseguia, Naomi recostou-se com Welita e os outros, ouvindo os mariachis. A certa altura, Welita liderou todos cantando a popular música do ranchero Cielito Lindo.
— Oh, Anita. Você é tão boa quanto a cantora Lola Beltrán — disse Chela, sua vizinha, quando Welita terminou de cantar.
Naomi olhou surpresa para Welita, estava tão acostumada a todos chamando-a de Welita que, às vezes, esquecia seu nome ‒ Anita. Ela entregou à avó uma garrafa de refrigerante Big Red, observando os olhos cintilantes que se enrugavam quando Welita ria. As mãos, revistidas pelo desgaste de décadas de trabalho duro, acariciou o joelho de Naomi quando ela agradeceu pela bebida.
Algumas horas depois, Welita cochilou e as pessoas começaram a deixar a festa. Naomi procurou por seu pai e acenou para ele quando o viu conversando com o Sr. Cruz.
— Ela está dormindo? — Javier perguntou quando se aproximou. Ele olhou para a mãe roncando e riu. — Ela parece tão jovem quando está dormindo. É como se ela não tivesse mudado nem um pouco.
— Mãe. — Ele cutucou seu ombro, tentando acordá-la. — Mamãe. É hora de ir para a cama.
— O que? Não, é uma festa. Eu posso ficar acordada um pouco mais — disse ela, esfregando os olhos.
— É quase meia-noite, Welita. Estou bem cansada também. — Naomi fingiu um bocejo e se levantou da cadeira. — Eu vou limpar. Você vai para a cama.
— Eu vou ajudá-la. — Welita deslizou-se para a borda do assento. — Me ajude a levantar, Javier.
Javier colocou a garrafa que estava segurando na mesa e estendeu um braço. Ela pressionou seu peso contra ele quando se levantou.
— Vá para a cama. Eu ajudarei Naomi — ele disse.
Welita se virou para o filho e deu um tapinha na bochecha dele. — Você é um bom menino e você criou uma boa filha. Meus graduados — ela disse enquanto pegava suas mãos nas dela. — Estou muito orgulhosa de vocês dois.
Naomi olhou para Chuy, que ainda estava conversando com alguns de seus amigos, enquanto ela e seu pai pegavam os copos e os pratos sujos. Sempre que Chuy olhava para uma das garotas, ela piscava os olhos e fingia que estava arrebatada por cada palavra que saía de sua boca. Ele as recompensava flexionando seu bíceps toda vez que levava a garrafa de cerveja aos lábios, ou quando se movia em volta da caixa de gelo, o que ele fazia muito.
Em um momento, Chuy olhou para Naomi e balançou as sobrancelhas quando uma garota chamada Rosie roçou contra ele. Ela era uma daquelas garotas ‒ o tipo com impressionante decote que fazia os homens babarem. Rosie passou os longos cabelos ondulados por cima do ombro e deu a Chuy um dos seus já conhecido sorrisos. Naomi enfiou o dedo na boca e fingiu engasgar. Ela não ficou impressionada. Rosie tinha uma reputação de flertar com qualquer coisa que se movesse, e ela tinha alguns bebês para provar isso. Se Welita estivesse acordada, provavelmente pegaria sua vassoura e afastaria Rosie.
— Ei, Naomi, venha aqui — gritou Chuy.
— O que houve? — Naomi acenou com uma oferta de cerveja de Lalo.
— O que há de errado com sua prima, cara? Ela é boa demais para beber conosco? — perguntou Mateo, um dos amigos de Chuy.
— Estou bem aqui, Mateo — disse Naomi, colocando as mãos nos quadris. — E para responder à sua pergunta, vim de moto, então a menos que eu queira passar a noite no sofá com os roncos de Chuy sacudindo a casa inteira, sem bebida para mim.
— Eu não ronco. Você ronca — disse Chuy.
— Uh, huh. Sim, claro. — Ela revirou os olhos.
— Vamos lá, Chuy, esfregue logo — disse Lalo. — Se sairmos agora, podemos ficar um par de horas na mesa de dados e estar de volta antes do nosso trabalho a tarde.
— Esfregar o que? E onde você está indo tão tarde? Você não tem trabalho amanhã? — Naomi golpeou as mãos de Chuy enquanto ele tirava o cabelo do ombro dela. — O que você está fazendo?
— Estamos indo para o Casino Lake Charles em Louisiana — disse ele enquanto tentava dobrar a parte de trás do colarinho da sua camisa. — Vamos lá, Naomi. Deixe-me esfregar para dar sorte.
Naomi bateu novamente nas mãos dele. — Pare com isso, Chuy. Meus esquisitos defeitos de nascença não são para o seu entretenimento.
— Eu vou te dar vinte dólares, se eu ganhar.
— Não.
— Aww, vamos lá.
— É apenas uma mancha de sardas, Chuy.
— Eles dão boa sorte.
— Você está falando sobre suas sardas? — Javier gritou enquanto passava por eles, arrastando um par de sacos de lixo cheios. — Elas dão boa sorte — disse ele antes de desaparecer no jardim da frente.
— Papai. — Ela gemeu.
— Viu? Até seu pai acha que dá boa sorte — disse Chuy.
— Eu tenho que ver isso. — Mateo deu um passo em direção a Naomi.
Chuy ficou na frente dele e colocou a mão em seu peito, mantendo-o à distância. — Sem chance, cara. É uma coisa de família.
— Sério, Chuy, você está ficando supersticioso como Welita. Só porque minhas sardas formam o número sete, isso não significa que dão sorte. Se fosse, você acha que eu deixaria Welita morar neste bairro... com você? — Era uma marca estranha na parte de trás do seu pescoço. Ela não tinha notado isso aparecendo até um dia, quando ela e Chuy foram nadar. Ele tinha se esgueirado atrás dela e estava prestes a empurrá-la na piscina quando notou a marca de formato estranho. Welita lhes dissera que Naomi nasceu com isso e que ela estava destinada a algo especial. Chuy entendeu que era um amuleto de boa sorte.
— É sorte. Na semana passada, depois de massagear seu pescoço, comprei um bilhete de loteria e ganhei cinquenta dólares.
Ela se irritou. — Eu pensei que você estava tentando ser legal porque eu estava tão estressada durante a última semana de aula!
Chuy tentou tocar seu pescoço novamente, e ela bateu nas mãos dele. — Pare com isso! Eu não sou um gênio em uma garrafa.
— E se eu deixar você entrar na minha aula de autodefesa?
Chuy se oferecera para dar aulas de autodefesa no centro comunitário local e ela estava pedindo a ele durante semanas para deixá-la entrar. Morando em Houston, especialmente neste bairro, autodefesa era algo que toda mulher precisava saber.
Naomi suspirou. — Tudo bem. — Ela levantou o cabelo e puxou a gola de sua camisa. — Depressa, acabe logo com isso.
Chuy deu um rápido esfregar. — Aí, isso não foi tão ruim, foi?
— Ugh, vá embora. E leve seus amigos com você. — Ela o empurrou de brincadeira e foi procurar o pai.

3
Naomi jogou o último saco na lata de lixo e sentou-se em frente ao pai nos degraus da varanda da frente. Ele estava brincando com uma moeda vermelha, seu símbolo de sobriedade de um mês, lançando-a por entre os dedos. Ela se encostou no corrimão olhando as estrelas no céu sem nuvens e ambos ficaram em um silêncio confortável, não querendo perturbar a rara quietude da noite. Tiros e sirenes soando à distância eram comuns. Mesmo que Naomi morasse a poucos quilômetros de distância, ela se preocupava com a avó e Chuy morando em um bairro tão perigoso.
— Você se divertiu, Mijita? — Perguntou Javier.
— Eu adorei, pai. — Naomi olhou para a garrafa marrom que ele segurava. Ela esperava que ele não estivesse bebendo de novo.
— É cerveja de raiz — disse ele, lendo a expressão em seu rosto. — Eu sei que você está preocupada que eu vou começar a beber de novo. Você tem a minha palavra que não vou beber novamente.
— Você mantém contato com seu padrinho?
— Todo dia.
— Bom.
Seu pai ficou quieto por um momento, se mexeu e limpou a garganta antes de falar. — Há algo que eu quero te dar.
— Papai...
— Antes de dizer não, deixe-me explicar. — Ele deu um tapinha no local ao lado dele. — Venha aqui.
— Mas...
— Por favor, isso é importante.
Ela deslizou através do degrau, e o desconforto tomou conta enquanto esperava que seu pai falasse. A última vez que ele fez a cara que estava fazendo agora foi quando teve que dizer a ela que sua mãe morreu.
Ele enfiou a mão no bolso e tirou um delicado colar de prata. Faíscas azuis e brancas brilhavam nos minúsculos diamantes que se alinhavam no crucifixo enquanto pendia sob a luz da varanda ‒ o colar de sua mãe. Lágrimas nadaram em seus olhos quando se lembrou de estar sentada na cama do hospital, a mãe pálida de dor, círculos escuros sob os olhos, as bochechas magras, mas sempre que ela tocava o colar, a paz cintilava em seus olhos. Sua fé era tão forte; Era algo que Naomi desejava que também tivesse.
Ela deslizou os dedos, sentindo o toque frio da prata. Quando a mãe morreu, o pai guardou-a numa pequena bolsa aveludada e levava-a sempre consigo. — Eu não posso.
— É seu — disse ele, sua voz soando alta na noite tranquila, mesmo que ele falasse com um sussurro.
Naomi baixou a mão. — Isso pertence a você.
Ele pegou a mão dela e virou-a. Ele largou o colar na palma da mão e olhou para o colar por um momento antes de fechar a mão dela. Colocando a mão sobre, ele olhou em seus olhos com um olhar firme. — O futuro está em suas mãos.
— Papai, eu...
— Você ouviu o que eu disse?
— Sim, mas...
— Vou me sentir melhor sabendo que você tem isso. Você está crescida e tem uma vida plena à sua frente. Você precisa sair para se divertir, conhecer alguém especial. Quando foi a última vez que você foi a um encontro?
Naomi fez uma careta. Havia algo sobre ver seu pai perder o amor de sua vida que colocava a palavra namoro em perspectiva. Ela pensou em todos os caras que tinha namorado antes, e não conseguia pensar em um com quem se importasse tão intensamente quanto seus pais se importavam um com o outro.
— Eu não estou interessada em namorar, pelo menos não por agora.
Javier sacudiu a cabeça. — Não se feche para o amor, Mijita. Quando for a hora certa, a pessoa irá encontrá-la. Tudo que você precisa é ter fé. — Ele pegou o colar da mão dela e colocou-o em volta do pescoço.
Naomi estudou seu rosto e se perguntou por que ele estava agindo tão estranho. Ele parecia querer contar mais a ela, então ficou em silêncio, esperando que ele falasse. Em vez disso, ele suspirou e se levantou.
— Onde você está indo? — Ela perguntou, surpresa por ele estar saindo.
— Trabalhar. — Ele tirou as chaves do carro do bolso. — Estou fazendo limpeza no escritório à noite.
— Você tem dois empregos de meio período?
— Eu tenho um monte de contas para pôr em dia. Não olhe para mim assim. — Ele bateu na linha de expressão no meio de sua testa. — Você vai ter rugas antes dos trinta anos.
— Agora que você está melhor, talvez possa conseguir um emprego de TI. — Ela olhou para longe, sabendo que até mesmo o seu diploma em ciência da computação não poderia apagar o rastro de repreensões que recebera de seus empregadores anteriores. Ela não podia deixar de manter a esperança de que em uma cidade grande como Houston, ele pudesse encontrar um emprego e que alguém lhe desse um novo começo antes que o mundo da tecnologia decolasse.
— Talvez. — Javier ligou a ignição, e as luzes que envolviam o Mustang piscaram para a vida.
— Você e Chuy fizeram um bom trabalho. — Naomi se afastou para ver melhor. — É muito legal. Vocês dois deviam entrar nesse negócio juntos.
— Isso não é uma má ideia. Embora, conhecendo Chuy, ele devoraria todos os lucros. — Ele colocou o carro em marcha a ré. — Te vejo amanhã. Não esqueça de colocar o capacete.
— Eu sempre coloco. — Ela acenou.
Ele estava na metade da rua quando do nada ela teve um forte desejo de correr atrás dele. Ela balançou a cabeça e se repreendeu por agir como boba.
— Eu o vejo amanhã. — Ela ligou a moto e seguiu na direção oposta.


Jane Sutherland encostou-se à pia e tirou os Jimmy Choos. Depois de cinco horas conversando e bebendo com os ricos de Houston e com os mais importantes do Texas, seus pés gritavam de dor. Ela mexeu os dedos quando o chão esfriou seus pés doloridos. Muito melhor, pensou. Se pudesse participar de eventos formais descalça, isso tornaria tudo muito mais divertido.
Ela olhou para o espelho e aplicou uma nova camada de batom rubi. Seu cabelo loiro platinado penteado para trás em um coque, destacava grandes olhos cor de safira. Quarenta e sete anos evitando o sol ‒ ela queimava com facilidade ‒ mantiveram o rosto pálido e sem rugas.
Houve uma batida na porta. — Senadora Sutherland? O Sr. Prescott tem um convidado que gostaria de lhe apresentar.
— Eu já estou indo. — Jane suspirou e colocou o batom em sua bolsa Gucci. Outro convidado. Outra bebida.
Quando ela começou sua carreira política, não tinha idéia de que a maior parte do tempo seria gasto na captação de recursos. Havia ingenuamente pensado que ela seria diferente dos outros. Ela faria a diferença. Agora, a única diferença que fazia era se seus apoiadores financeiros se beneficiariam de suas generosas doações para sua campanha.
Ela abriu a porta para encontrar um homem de aparência distinta em pé no corredor.
— Senadora. — Ele abriu um sorriso glorioso. — Eu estava prestes a ver se você precisava da minha ajuda.
— Se bem me lembro, da última vez que você se ofereceu para me ajudar e veio atrás de mim no banheiro feminino, espirrei água em toda a sua gravata de seda. — Jane sorriu para Luke Prescott.
Ele ofereceu seu braço, e ela colocou a mão. — Eu estava te fazendo um favor, te levantando para poder lavar as mãos. Eu não tinha ideia de que você destruiria minha gravata de seda favorita.
— Esse é o risco de ter uma criança de cinco anos de idade como companhia. — Jane apertou o braço carinhosamente.
Seu pai trabalhava para Luke Prescott e ele era um amigo próximo da família. Ao crescer, Luke estava sempre presente nos eventos importantes de sua vida, na liderança da peça da escola, graduação, formatura, mesmo quando o pai não estava. Então, quando a mãe morreu, ele ligava pelo menos uma vez por dia. Ele se tornou seu confidente mais próximo. Foi ideia dele ir para a faculdade de direito, e depois disso, ele encorajou e apoiou sua corrida para o congresso.
— Graças a Deus, eu tinha uma dúzia mais como aquelas. — Seus olhos cinzentos brilharam.
— E por que você não teria? Eu imagino que um bilionário teria pelo menos um par.
— Vamos lá, Jane. Seja gentil com os super ricos, nós também temos sentimentos.
Jane parou na entrada do salão de baile. A sala estava cheia de apoiadores do partido da Federação Americana, todos esperando grandes coisas dela. Tudo o que sempre quis foi ajudar a dar às pessoas uma vida melhor. Quando isso se transformou em usar um vestido de grife e conversar com pessoas que pagavam o preço de um carro pequeno só para estar na mesma sala que ela? Se não fosse Luke insistindo e comprando seu guarda-roupa, o que ele considerava um uniforme necessário, ela usaria algo menos ostensivo.
— Estou um pouco cansada, Luke. Vamos encerrar a noite.
— Mais uma pessoa — ele sussurrou em seu ouvido. — Os Conoleys estão morrendo de vontade de conhecê-la pessoalmente. Eles voaram todo o caminho desde Oklahoma.
— Em seu jato particular, tenho certeza.
— É um pequeno.
— Oh, minhas desculpas. — Jane fingiu preocupação. — Eu não sabia o quanto eles estavam sofrendo. Vamos conhecê-los. — Ela poderia muito bem acabar com isso. Por mais que odiasse a arrecadação de fundos, ela era apaixonada pelo partido da Federação Americana, acreditando que seu valor central de responsabilidades fiscais e comunitárias beneficiaria o país.
Depois de conhecer os Conoleys e tomar uma bebida com eles, Luke a levou para outro grupo de pessoas para se conhecerem. Toda vez que tentava sair, Luke achava uma desculpa para ela ficar. Era estranho que, à medida que a noite avançava, ela se sentia bêbada, embora mal tivesse bebido um copo de vinho. Ela olhou para a bebida, imaginando como ainda poderia estar meio cheia, era como se não estivesse bebendo nada.
— Já tive o suficiente, Luke — disse ela.
— Vá e tenha o seu sono de beleza. — Ele acenou para um homem alto de pé na periferia da sala. — Sal vai te seguir até em casa.
— Isso não é necessário — disse ela. Sal era o guarda costa pessoal de Luke. Onde quer que Luke fosse, Sal estava logo atrás, espreitando nas sombras. Ele tentva se misturar com os outros, o que era difícil para uma enorme massa de dois metros de músculos, e as botas de crocodilo que sempre usava também não ajudavam.
Sal estava ao lado de Luke, seu rosto vazio de emoção. Seus olhos negros olharam por cima de Jane e, por um momento, ficaram tensos e a olharam como se ela estivesse abaixo dele. Uma sensação fria atingiu a boca do seu estômago, ele nunca tinha olhado para ela assim antes e se perguntou o que fez para ganhar um olhar assim.
Luke deu-lhe um leve aceno e Sal deu a Jane um último olhar antes de abrir caminho pela multidão e desaparecer do salão de baile. — Eu vou deixá-la ir agora, mas você terá que se acostumar a ter pessoas ao seu lado em todos os momentos quando for presidente. — Luke a pegou pelo cotovelo e caminhou até o saguão.
Jane riu. — Você está se adiantando. Vamos esperar e ver se consigo sobreviver ao meu mandato atual. Eu mal ganhei meu assento na primeira vez. — Quando Luke e seus amigos sugeriram que concorresse para o Senado pelo Partido da Federação Americana, ela nunca pensou que realmente venceria, já que o partido era novo e tinha poucos apoiadores. Luke, por outro lado, não teve dúvidas.
— Eu nunca estive errado quando se trata de situações como esta. Marque minhas palavras, Jane. Você será a presidente dos Estados Unidos.
As palavras enviaram um arrepio através de Jane. Ela deveria ter ficado feliz em ouvir essas palavras, Presidente Sutherland. Por que o frio que sentia parecia mais medo do que excitação?
Uma leve chuva caia enquanto ela dirigia seu prateado Jaguar XF ‒ um presente de Luke quando se formou na faculdade de direito há muito tempo ‒ nos arredores de Houston em direção a sua casa nos subúrbios. Sentindo-se leve, ela ligou o ar e dirigiu o ar frio em direção ao rosto. Agarrando o smartphone, apertou um botão e esperou pelo bipe familiar.
— Toque Mozart — ela instruiu.
Eine Kleine Nachtmusik tocou através dos alto-falantes enquanto dirigia por uma estrada sinuosa. Os faróis do carro ricochetearam no vidro dos prédios de escritórios pelos quais passou. Enquanto ela olhava para a estrada, lutando para se manter acordada, viu uma luz na rua piscando à distância. Quando passou, a luz se intensificou e depois voltou ao normal. Ela então viu outra luz fazendo a mesma coisa ‒ piscar, ficar mais brilhante, depois voltar ao normal ‒ enquanto passava por cada um deles.
Eu devo ter bebido mais do que pensei. Ela deu um tapa nas bochechas levemente.
O telefone tocou e ela pulou assustada. Olhando para baixo, viu o nome “Luke Prescott” escrito na tela.
Tudo pareceu acontecer de uma vez. Um peso enorme pressionou seu peito, e por um segundo, ela pensou que estava tendo um ataque cardíaco. A pressão se espalhou como se envolvesse todo o seu corpo em um casulo, protegendo-a. Foi o mesmo sentimento que teve trinta e cinco anos atrás, pouco antes do avião em que ela e sua mãe estavam, caísse. Houve um grito de pneus e uma descarga de adrenalina a varreu. A última coisa que viu antes de desmaiar foi um cavalo dançando em direção a ela.

4
Lash observou a ruiva alta enquanto ela escaneava a sala cheia de fumaça. A única iluminação vinha da fileira de luzes que se alinhava no palco, onde alguns de seus colegas de trabalho se apresentavam no pole. Era o final da tarde, e o negócio estava lento, exceto pelo grupo de velhos aposentados que eram frequentadores do bar. Quando seus olhos vagaram para o canto de trás da sala e se trancaram com o dele, ele sorriu para a luxúria óbvia escrita em seu rosto enquanto ela observava a camiseta preta desbotada que moldava seu peito esculpido, jeans rasgados abraçando seus quadris, e cabelo escuro e selvagem.
Lash abriu um sorriso quando ela se aproximou dele. Seus olhos viajaram sobre seu corpo, olhando as longas curvas de suas pernas, os seios cobertos por uma estampa de leopardo, e o fio dental forrado de dólar que abraçava a sua cintura, deixava pouco para a imaginação. Ele se levantou para encontrá-la quando uma mão bateu em seu ombro e o empurrou de volta para o seu assento.
— Gabrielle — ele rosnou. — Como você me achou?
— Saia daqui, irmã. Este é meu — a ruiva disse enquanto olhava para Gabrielle.
Gabrielle olhou para a ruiva e franziu a testa. Balançando a cabeça, ela tirou a jaqueta de couro e jogou para a garota. — Deixe este lugar e não retorne.
A ruiva piscou, parecendo confusa.
Gabrielle se inclinou para ela e sussurrou: — Você encontrará um emprego melhor amanhã. Eu prometo.
Atordoada, a ruiva simplesmente balançou a cabeça, colocou a jaqueta de Gabrielle e saiu pela porta.
— Michael não gosta quando você usa seus truques mentais Jedi em humanos. — Lash sacudiu um dedo.
Gabrielle puxou uma cadeira e limpou-a com um guardanapo antes de se sentar. — Trinta e cinco anos na Terra e o máximo que você conseguiu foi um conhecimento profundo dos filmes de George Lucas. Excelente.
— Vamos chamá-lo de um estudo antropológico da natureza humana. — Lash sorriu enquanto levantava sua bebida.
Gabrielle franziu a testa. — Você contamina o seu corpo assim como a sua mente.
— Eu acho que você acharia divertido.
— Eu tenho coisas mais importantes para fazer do que assistir você mergulhar em sua miséria autocriada.
— O que? Você não se importa se eu fui para o lado negro? — Lash fingiu inocência ao arregalar os olhos. — Estou ferido.
— Eu não sei o que Raphael vê em você. Estou perdendo meu tempo aqui.
— Se você não planeja tirar essas roupas e dançar em torno daquele poste lá, então, sim, eu diria que você está.
Seus olhos ficaram frios. — Grosso.
— Algumas mulheres gostam. — Ele sorriu sem se arrepender.
— Ugh, vamos acabar com isso. Eu tenho uma tarefa para você.
— Eu estou fora dos negócios da família, lembra? — Lash se recostou em seu assento. — Pelo que me lembro, você estava lá quando fui jogado sem cerimônia para fora da porta.
— Foi o destaque do meu século.
— Tenho certeza que foi. — Lash olhou em seus olhos de gato e desejou que ele pudesse apagar a presunção de seu rosto. — O que quer que tenha, eu não estou interessado.
Gabrielle arqueou uma sobrancelha. — Você tem certeza? — Ela tirou um pedaço de papel dobrado do bolso de trás da calça jeans e acenou na frente do rosto dele. — Você não está nem um pouco curioso do porquê Michael lhe daria uma tarefa depois de todos esses anos?
Ele estava curioso, mas de maneira nenhuma queria que Gabrielle soubesse disso. Inclinou a cadeira para trás, equilibrando-se nas pernas traseiras e colocou as pernas sobre a mesa. — Eu não poderia me importar menos.
— Eu disse a Raphael para não perder o seu tempo.
Sua cadeira vacilou, ameaçando desequilibrá-lo. Ele rapidamente se ajustou. Sem tirar os olhos dela, ele disse: — Pela primeira vez, nós concordamos em algo.
Gabrielle jogou o papel para o centro da mesa. — Se você se importa ou não, não é da minha conta. O que você faz com isso é sua escolha.
Lash olhou para o papel com o canto do olho. Ele sabia que ela continuaria a observá-lo depois que saísse para ver se ele iria dar uma olhada. — Saindo tão cedo? — Ele deixou cair as pernas da frente da cadeira para o chão quando ela se levantou.
— Eu tenho coisas melhores para fazer do que assistir você desperdiçar seus dons. Michael deveria ter tirado tudo de você no momento em que te expulsou.
— Dons? Por favor. Não me faça rir. Estou limitado com o que posso fazer em minha forma humana, você sabe disso. — Sua capacidade de ver e ouvir ainda era melhor do que a de um humano, e ele era muito mais forte do que eles, mas sua habilidade de vôo foi severamente diminuída e odiava isso.
— Oh, pobrezinho — disse ela antes de se virar e caminhar em direção à porta. — Eu acabei por aqui.
— Espere — Lash gritou atrás dela. — Por que Michael mandou você entregar a tarefa?
Gabrielle se virou, os olhos penetrantes travados com os dele e os lábios se transformaram em um sorriso perverso. — Eu me ofereci.
Suas palavras eram como um tapa na cara. Ela sabia que entregando a mensagem, ele iria recusar. Deve ser algo realmente importante para ela estar desesperada o suficiente para ter certeza de que ele não aceitasse.
Lash estendeu a mão para o papel e o sorriso de Gabrielle congelou. Ele riu. — Você realmente não quer que eu veja isso, não é?
Gabrielle suavizou suas feições e encolheu os ombros. — Como eu disse, realmente não me importo. — Ela abriu a porta, deixando a luz da tarde se infiltrar no clube escuro. Quando ela saiu pela porta, murmurou baixinho. — Fraco — E fechou a porta com força.
— Cadela! — Lash gritou atrás dela, sabendo muito bem que ela podia ouvi-lo mesmo se tivesse sussurrado isso. Sem pensar, ele pegou o papel, rasgou-o e jogou-o no ar. Quando os pedaços brancos flutuaram até o chão, ele drenou o último gole de seu uísque e bateu o copo na mesa, quebrando-o.
Maldito corpo humano e sua sensibilidade à dor. Ele estremeceu quando abriu a mão e arrancou cacos de vidro da palma da mão. O sangue escorria e pingava na mesa.
— Querido, você está... oh Meu Deus, você está sangrando — uma mulher falou pausadamente. Ela correu para o bar e voltou com um pano de prato. — Envolva isso em volta da sua mão.
Lash tirou a toalha dela com raiva porque Gabrielle levou a melhor sobre ele.
— Ei! Você não precisa ser um idiota — disse a mulher.
Lash olhou para cima e olhou para um par de olhos verdes semelhantes aos de Gabrielle, exceto que eram muito mais gentis. Ela ofegou.
— Você é lindo — ela murmurou, hipnotizada. — Existe alguma coisa que eu possa te trazer?
Lash sorriu. Em suas formas humanas, todos os anjos eram vistos como impressionantes para os humanos, mesmo os caídos. Felizmente para ele, todas as mulheres que encontrou desde que foi expulso, estavam desesperadas por sua atenção e fizeram qualquer coisa que ele pediu a elas. No começo, ele não queria se aproveitar, mas quando percebeu que estava sozinho, precisava ganhar a vida de alguma forma. Belo corpo ou não, precisava ser vestido, alimentado e abrigado. Os humanos tinham uma manutenção tão alta.
— Não, estou bem. É só um arranhão — disse Lash enquanto limpava a mão e colocava no bolso da jaqueta. Ele sabia que dentro de alguns minutos a ferida seria curada. Era um dos dons que foi autorizado a ter ainda e que veio a calhar ao longo dos anos.
— Você tem certeza? Parecia muito ruim.
— Sim, tenho certeza. — Ele a estudou enquanto ela pegava os cacos de vidro com cuidado e os jogava em uma lata de lixo nas proximidades. No bar esmaecido, ela parecia uma versão mais jovem de Gabrielle. Quando ela voltou, seus olhos percorreram as marcas em seus braços. Sua mão tocou um saquinho dentro do bolso e ele sorriu. Um pensamento surgiu em sua mente sobre como ele poderia dar o troco em Gabrielle e se divertir um pouco ao mesmo tempo.
Ele deu à mulher seu olhar mais ardente. — Qual o seu nome?
Seus olhos escureceram. — Megan — disse ela sem fôlego.
Ele se inclinou e colocou uma mecha de cabelo loiro atrás da orelha. — Interessada em um bom momento?


Lash se concentrou na pressão que crescia na boca do estômago. Seu corpo balançava para frente e para trás, saboreando o calor em sua pele ‒ o único tipo de calor que podia lhe dar alívio da dormência dos últimos trinta e cinco anos.
No começo, ele pensou nisso como uma aventura, viver entre os humanos. Estava sinceramente curioso em saber como era estar do outro lado. Ele pensou que seria perdoado e levado de volta ao rebanho, não era como se tivesse cometido um pecado mortal ou algo assim. Mas os meses se transformaram em anos e anos em décadas e quando percebeu que nunca iria para casa, seu coração ficou frio.
Ele fechou os olhos, tentando apagar a expressão presunçosa no rosto de Gabrielle quando foi mandado embora, mas ficou gravado em sua mente.
Incomodava-lhe que fosse expulso tão facilmente, que não reconhecessem como foi difícil para ele ajudar pessoas que eram tão ingratas. Chegou ao ponto em que muitos se sentiam merecedores do que ele tinha para dar, acreditavam que tudo o que tinham que fazer era pedir e receberiam. Sim, houve momentos em que ele foi contra as ordens, mas tudo deu certo no final, e suas atribuições foram deixadas melhores por isso. Quando se tratava da menininha que realmente merecia viver, ele seguiu puro instinto. Ele tinha certeza de que Michael estaria do seu lado sobre isso. Bem, foda-se isso e foda-se o trabalho dele.
Um gemido o distraiu de seus pensamentos, e ele olhou para a fonte. Fios de cabelo pintados de loiro balançavam em sincronia com os quadris dele, roçando as coxas na sua. Sensações quentes e úmidas o envolveram enquanto pressionava nas profundezas escorregadias de sua boca mais rápido, desesperado por calor, por liberar-se da escuridão que o dominava.
— Porra! — Ele gemeu quando a pressão dentro dele explodiu. Nesse pequeno momento, ele escapou das correntes invisíveis que o amarravam ao frio, e o calor se espalhou por seu corpo. Ele estava em casa novamente, andando sob o céu azul brilhante, o sol brilhando em seu rosto.
Tão rapidamente quanto veio, desapareceu e um frio deslizou pelas costas, fazendo-o estremecer. O fedor de ovos podres e urina o atingiu abruptamente, e seus olhos se abriram. Ele estava de volta ao inferno que era sua vida agora. Ontem foi o Motel Triple Leaf; hoje era o The Lucky Seven Inn. Eles eram todos iguais, assim como as mulheres que o ajudaram a encontrar sua fuga, mesmo que fosse só por um minuto.
Olhos verdes olhavam para ele. Ele imaginou que era orosto dela, aquela que o condenara ao seu destino, a andar na terra longe da família e dos amigos. — Engole.
Megan engoliu em seco, depois se levantou devagar, esfregando seu corpo magro e nu contra o dele. — Vamos, baby, me dê um pouco — ela ronronou.
Ele pegou sua calça jeans, tirou um saquinho de cristal transparente e jogou para ela.
Ela gritou e correu para o outro lado da sala onde sua bolsa estava. Ela jogou seu conteúdo no chão, fazendo com que uma enxurrada de baratas corresse para se esconder.
Lash andou até a cozinha, se é que poderia dizer isso em um apartamento de um quarto, serviu um copo de uísque enquanto observava Megan. Como um cirurgião, suas mãos se moviam com precisão, segurando um isqueiro sob uma colher enferrujada com uma mão e uma agulha na outra. Por um breve momento, sua consciência pesou com culpa.
— Oh, baby, essa é da boa! — Ela soltou a faixa de seu braço, rastejou para a cama, e olhou para ele sedutoramente. — Por que você não se junta a mim?
Na penumbra, ele viu uma sugestão da beleza que ela fora uma vez. Era óbvio que seu vício em drogas havia cobrado seu preço ‒ o cabelo dela estava quebrado e oleoso, e sua pele parecia pálida. Braços furados por agulhas estendiam-se para ele. — Venha aqui. Vou te ajudar.
— Eu precisaria de muito mais do que isso para conseguir qualquer tipo de barato. — Ele pegou suas roupas do chão e jogou-as para ela. — Coloque-as.
Ela puxou uma camiseta roxa desbotada pela cabeça. — Por que isso? Você é algum tipo de super-humano ou algo assim?
Ele bufou. — Se eu te mostrar uma coisa, promete manter isso em segredo?
Ela rastejou até a beira da cama. — Juro por Deus. — Ela fez o sinal da cruz sobre a parte esquerda de seu peito.
Lash sorriu e deu um passo para trás. Ele baixou os braços para o lado, as palmas voltadas para cima e relaxou os ombros. Então, ele empurrou.
A garota ofegou ao som de pele rasgando.
— O que você está fazendo? — ela gritou quando gotas de sangue caíram no chão.
Ele sorriu. — Espere. Tem mais.
Seus olhos se arregalaram quando dois objetos brancos surgiram, alinhando ao comprimento de suas costas. Ele deu um último empurrão e elas se expandiram.
— O que... — Ela esfregou os olhos. — Porra! Você é um anjo.
Ela pulou ao som de alguém batendo na porta.
— Lahash, sou eu, Raphael. Abra a porta. Eu sei que você está aí.
— Vá embora! — Lash rosnou.
A porta se abriu e Raphael entrou. Frios olhos azuis olharam para Lash. — Eu tive o suficiente de seu absurdo, Lahash.
— Oh uau — disse Megan, seus olhos se arregalando. — Você é Ele? Você é... — ela engoliu — Deus?
Raphael olhou para a garota seminua. Seus olhos se suavizaram. — Qual é o seu nome, minha filha?
— Megan. — Olhos vidrados olhavam para ele com admiração.
Lash deu um passo à frente. — Raphael, você não tem...
— Eu sei o que vai dizer e você está errado, eu tenho o direito de estar aqui. — Os lábios de Raphael pressionaram em uma linha fina enquanto olhava para frente e para trás entre as asas de Lash e o rosto chocado de Megan. — Você não deveria ter se exposto assim para ela. Será apenas um sofrimento para a pobre garota.
— Oh, eu expus partes de mim que você sequer poderia sonhar. — Lash fechou sua calça jeans e sorriu.
— O que aconteceu com você? — Raphael deu um passo à frente, seu rosto mudando de raiva para preocupação. — Você nunca falou comigo com tal desrespeito.
— Trinta e cinco anos aconteceram! O que você esperava? — Lash cruzou as asas em seu corpo e pegou sua camisa. — Ela provavelmente vai pensar que é uma parte do barato por causa da droga. — Para o bem dela, ele esperava que ela não se lembrasse. Raphael estava certo ‒ ele nunca deveria tê-la trazido aqui. Ele não estava prestes a admitir isso para ele, no entanto. Gabrielle pode ter sido aquela a expulsá-lo, mas ele não tinha ouvido nada de quem achava ser seu amigo, até agora.
Raphael balançou a cabeça e então, se virou para Megan com uma expressão de pena. — Venha cá, minha filha.
Megan tropeçou em direção a Raphael e estava prestes a cair quando ele a pegou. Ele levantou a cabeça, estudando-a atentamente. — Você sabe quem eu sou?
— Deus — ela sussurrou.
— Eu sou Raphael, Arcanjo da Cura, Compaixão e Amor. Você corrompeu seu corpo para aliviar a dor que lateja profundamente em sua alma. Ele sabe o que seu coração deseja, você só tem que pedir e será dado.
Ela piscou confusa. — Quem é ele?
— Ele é conhecido por muitos nomes diferentes: Deus, Senhor, Allah, Yahweh… todos são um e o mesmo. Saiba disso: Ele te ama.
— O que eu peço?
— O que você quiser. — Raphael embalou seu rosto em suas mãos.
Ela olhou nos olhos de Raphael e seu rosto se contraiu. Ela caiu de joelhos, envolvendo os braços ao redor de suas pernas. — Faça isso ir embora, por favor. Não quero mais sentir a dor.
Raphael se agachou no chão e pegou as mãos de Megan na sua. — O homem que se auto titula de pai, não vai mais te machucar. Você não é um objeto sexual ou a escrava sexual pessoal que ele fez você ser. Você é filha de Deus e, com fé Nele, encontrará paz.
O coração de Lash doeu quando viu as lágrimas escorrerem por suas bochechas, e a culpa o dominou novamente. Ela não foi a primeira mulher que ele usou. Foi fácil passar de uma garota para outra; era só sexo. Elas estavam felizes ‒ ele estava feliz. Qual era o mal? Contanto que ficasse por uma noite e não as conhecesse, ele seria capaz de manter-se atrás do muro que construiu. No fundo, no entanto, ele sabia que o que estava fazendo era egoísta e errado.
Raphael segurou o braço dela e passou a mão sobre os novos rastros de agulha. Megan gemeu quando uma onda percorreu o comprimento de seu braço, como um verme preso debaixo de sua pele. O movimento parou no pequeno orifício do local da injeção e uma substância branca semelhante a gel vazou.
Os olhos de Megan se arregalaram e ela estremeceu quando o gel branco caiu no chão. Quando acabou, ela olhou para Raphael, seus olhos claros e coerentes. — Obrigada.
— Vá agora e não peques mais.
Megan beijou as mãos dele. Rapidamente, vestiu a calça jeans e pegou a bolsa, jogando o conteúdo e a parafernália de drogas nela. Quando ela foi até a porta, seus olhos encontraram os de Raphael e suas bochechas ficaram vermelhas de vergonha.
Raphael tocou sua bochecha levemente. — Lembre-se, o que uma vez foi, agora não é mais.
Ela abriu um sorriso, olhou para a bolsa, então se virou e jogou na lata de lixo antes de sair com a cabeça erguida.
Lash foi até a lata de lixo e vasculhou a bolsa, pegando um isqueiro e um baseado de maconha. Ele olhou para Raphael, desafiando-o a fazer algo quando acendeu e deu uma tragada.
— Lash, você não pode me dizer que isso... essa coisa está realmente tendo qualquer efeito em você — Raphael reclamou. — Nossos corpos não reagem a substâncias estranhas como corpos humanos.
— Não — disse ele, prendendo a respiração por um momento e, em seguida, expelindo lentamente a fumaça. — Eu não sinto nada.
Raphael fez uma careta. Lash estava prestes a dar outra tragada quando ‒ com um aceno da mão de Raphael ‒ a fumaça se dissipou e o baseado se transformou em cinzas. — Então, por que, por favor, diga, você sequer se incomoda em sujar seu corpo com isso?
— Porque isso enlouquece você. — Ele sorriu.
Os olhos de Raphael ficaram frios. Ele agarrou Lash pelo pescoço e o empurrou contra a parede. Ele se inclinou para perto, seu rosto a menos de um centímetro de Lash. — É exatamente essa atitude que te fez ser banido do céu.
— Para o inferno que foi. — Lash lutou contra ele. — Aquela cadela, Gabrielle, me trouxe até aqui, ela não precisava me denunciar.
— Não, Lahash . Foi você. Foi tudo você. — O rosto de Raphael avermelhou quando ele pressionou Lash na parede, fazendo com que a quebrasse. — Você interferiu em seu papel e desafiou a autoridade dela como arcanjo. Todas as missões são dadas para um propósito e devem ser seguidas em conformidade. A garota não deveria sobreviver ao acidente.
— Gabrielle — o nome cuspido como se fosse algo amargo —, estava esperando por uma oportunidade para me expulsar. Ela me odeia.
— Isso não é verdade.
Ele franziu o cenho. — Ela odeia. Você é muito cego para ver isso.
Raphael fechou os olhos, respirando fundo. Sua raiva não estava ajudando Lash a ver a razão; estava fazendo o oposto.
— Eu sei que vocês dois não estão nos melhores termos.
— Isso é um eufemismo — Lash murmurou.
Raphael o ignorou e continuou. — Ela tem o melhor interesse de todos no coração, incluindo o seu. Tenho certeza disso. — Ele soltou seu aperto e se afastou. — Você foi imprudente, desconsiderando aqueles ao seu redor. Eu não entendo esse tipo de comportamento de você.
Lash suspirou e sentou-se na beira da cama. — Eu não vejo o ponto. Por que nos incomodamos com o que fazemos? As pessoas farão o que quiserem, de qualquer maneira. Como Megan. Ela provavelmente estará drogada novamente dentro de uma hora.
— Esse é o problema com você, Lash. Você perdeu a fé.
— Fé? — Lash pegou um controle remoto da mesa de cabeceira e ligou a televisão, passando os vários canais, pausando um momento entre cada toque do botão. Sua mandíbula apertou enquanto fazia uma careta para cada imagem que cobria a tela: homens cobertos de sangue, corpos caídos em uma estrada de terra, e mulheres envoltas em preto, gritando em angústia; um prédio destruído com fumaça e cinzas girando no ar, e mulheres e crianças saindo dele, cobertas de cinzas; um garotinho de pele escura, não mais do que quatro anos de idade, vestido com uma bermuda enlameada, o estômago inchado de fome e rosto inexpressivo enquanto permanecia sozinho na beira de uma estrada.
Ele parou em um canal que mostrava um grupo de mulheres que se vestiam e vestiam crianças para parecerem prostitutas de alta classe com a intenção de ganhar um concurso de beleza.
Lash jogou o controle remoto, quebrando a tela. — É nisso que você quer que eu tenha fé? Como posso confiar neles?
Raphael olhou para a televisão rachada, seus olhos brilhando. — Lash, você não acha que eu me senti da mesma maneira que você? Eu também tenho lutado para colocar minha fé nas pessoas, especialmente quando parece que ninguém se importa com outros além de si mesmo. — Raphael colocou a mão em seu ombro. — Michael concordou em lhe dar mais uma chance. Ele permitirá seu retorno se você provar sua devoção e fé.
— Por que eu iria querer fazer isso? — Lash perguntou, fingindo desinteresse. O muro que ele havia construído em torno de si, para protegê-lo de se machucar, estava em pleno vigor.
— Você não pode me enganar, eu sei que você quer voltar.
Merda. Ele deveria saber que Raphael iria ver através dele.
— Bem. O que eu preciso fazer?
Alívio brilhou nos olhos de Raphael, e ele estudou seu rosto enquanto tirava um envelope do bolso interno de sua jaqueta. — Esta é a localização e a foto da sua próxima tarefa.
Lash suspirou quando abriu o envelope e retirou o cartão. — Naomi Duran — ele leu. — Duran. Espere, ela está relacionada com Javier Duran?
Raphael abriu e fechou a boca. Lash poderia dizer que havia algo importante que ele queria dizer, mas parecia que algo o detinha.
— Tudo o que posso dizer é que é de vital importância que você a mantenha segura — disse Raphael.
Lash amaldiçoou em voz baixa. Eles não iam facilitar para ele. Ele virou o cartão e olhou para a foto. Uma mulher jovem e bonita, com grandes olhos azuis pálidos, olhava para ele. A sala ficou imóvel enquanto estudava a foto. Ele olhou para cima e encontrou Raphael inclinado em direção a ele com expectativa.
— O que?
— Nada. — Raphael desviou os olhos. Ele caminhou até a única janela na sala e puxou a cortina para trás. — Dê outra olhada. Se você precisa de uma foto de melhor qualidade, posso adquirir uma para você.
Lash olhou para Raphael desconfiado, ele estava agindo de forma estranha. Lash olhou para a foto novamente, havia algo familiar sobre ela que não conseguia identificar. Ele traçou um dedo sobre seus lábios vermelhos cheios. Ele não poderia ter sido atribuído a ela no passado; teria se lembrado de alguém que se parecia com ela. — A foto está boa. Então, tudo o que tenho que fazer é mantê-la segura. De que?
Raphael olhou pela janela suja e depois inclinou a cabeça como se estivesse ouvindo alguma coisa. — Vamos fazer isso rápido — disse e marchou para Lash. Ele colocou a mão contra as têmporas de Lash, e uma visão de Naomi apareceu em sua mente.
— O que... ela está tentando se matar? — Lash gritou.
Rafael retirou a mão e dirigiu-se para a porta.
— Você não pode simplesmente me mostrar isso e correr — disse Lash.
— Eu não deveria ter te mostrado isso. — O rosto de Raphael se enrugou de preocupação quando saiu.
Lash correu para o corredor. — Espere! Michael pelo menos me deixará ter todos os meus poderes de volta?
Raphael continuou a andar, sua imagem desaparecendo a cada passo que dava. — Não. Você deve fazer isso sozinho. — Com essas últimas palavras, ele desapareceu.

5
Jane limpou as mãos suadas na bainha da saia preta e olhou pela janela escura do Mercedes para o pequeno aglomerado de pessoas reunidas em torno do caixão fechado. — Isso está errado, Luke. Eu não deveria estar aqui.
Luke desligou o telefone e deu um tapinha na mão de Jane. — Nós já discutimos isso. Seria pior se você não desse a família suas condolências pela perda — disse ele. — Você está perfeitamente segura, Sal estará bem atrás de você.
— Não é isso que eu quis dizer — disse ela. A última coisa que precisava era intimidar a família com a presença de Sal. — Por minha causa, o pobre homem está morto. Eu sou a última pessoa que eles querem ver.
— Foi considerado um acidente — ressaltou.
— O homem está morto. — Ela fechou os olhos e apertou a mão na testa. Agora não era hora de ter outra enxaqueca. — Eu não estava prestando atenção na estrada e, por causa disso, um homem perdeu a vida.
Luke pegou a mão dela e deu-lhe uma aspirina. — Você não estava distraída. — Ele entregou-lhe uma garrafa de água. — Uma das minhas fontes na investigação me disse que havia álcool no sistema dele.
— Eu tenho certeza que eles teriam encontrado no meu também se tivessem se incomodado em verificar. — Jane colocou o comprimido em sua boca e voltou sua atenção para o funeral. Uma mulher pequena e idosa, provavelmente a mãe do homem, encostou-se a um rapaz e chorou no peito dele.
— Agradeça ao pensamento rápido do Sal. — Luke virou-se para o som de pedras esmagadas quando uma van de notícias parou ao lado do carro. — Boa. Eles estão aqui.
— Você chamou a mídia? — Jane engasgou. — Inacreditável.
— Olha Jane. Não podemos nos arriscar que esse incidente manche sua reputação impecável. — Luke bateu na parte de trás do banco do motorista. — Ela está pronta — disse ele para Sal.
— Eu prefiro fazer isso em particular. — Ela detestava a ideia de ter suas desculpas transmitidas no noticiário da noite.
— Sua corrida para cargos políticos afeta além de você — disse Luke inflexivelmente. — Pense em toda a mão-de-obra e dinheiro que fizeram você ser que é hoje. Você deve isso ao partido.
Por mais que Jane detestasse admitir, ele estava certo; muitas pessoas confiavam nela e no jogo da política, imagem era tudo.
Luke olhou para o relógio. — São apenas alguns minutos. Você tem a angariação de fundos do Hospital Infantil de Houston em uma hora.
O estômago de Jane se agitou. Ela não conseguia pensar em deixar esta pobre família e depois ir direto para um evento de angariação de fundos, onde daria seu discurso sobre a importância de uma comunidade se apoiar mutuamente em momentos de necessidade. Ela se sentia como uma fraude.
A porta se abriu e Sal estendeu a mão, esperando. Ela suspirou quando colocou a mão na dele e saiu. Enquanto caminhavam em direção ao encontro, ela podia sentir olhos olhando para ela com curiosidade. Ela manteve a distância e esperou pelo momento apropriado para se aproximar dos Durans. Ela não pôde deixar de pensar no menino, Javier, que estava sentado atrás dela naquele dia fatídico em que seu voo de Los Angeles caiu, matando todos, exceto eles dois.
Quando ela descobriu que o homem com quem colidiu se chamava Javier Duran, ela fez Luke checar seu passado. As chances de ele ser o mesmo Javier que ela conhecera há muitos anos eram pequenas, mas não conseguia se livrar da sensação incômoda de que era a mesma pessoa. Ela ficou aliviada quando Luke disse que não era, mas triste quando soube que o Javier do avião havia morrido anos atrás de câncer.
— Senadora — Sal tocou seu cotovelo e levou-a para mais perto do encontro.
Jane olhou para a equipe de reportagem e apertou os lábios em uma linha fina. O poder do dinheiro, ela pensou. Certifique-se de obter a garota-propaganda do partido da Federação Americana na foto consolando a família.
Quando a cerimônia chegou ao fim, Jane esperou que os outros saíssem antes de se aproximar. Respirando fundo, ela enxugou as mãos contra a saia uma última vez e caminhou em direção à família em luto.


Levou cada grama de força para Naomi ficar onde estava e não fugir da dor que ameaçava dominá-la. Nos últimos dois dias de preparação para o funeral, ela conseguiu afastar a dor de perder seu pai.
A visão de Welita chorando em seu lenço de renda preta rasgou seu coração, e ela se perguntou que tipo de Deus faria isso com eles. De todas as pessoas do mundo, por que ele? Porque agora? Não era justo, seu pai estava finalmente transformando, reconstruindo sua vida, apenas para perdê-la em um instante.
Ela colocou uma rosa em seu caixão e se perguntou o que faria sem ele. Foi então que viu, pelo canto do olho, uma mulher esbelta saindo de um Mercedes preto. Seus olhos se estreitaram quando reconheceu quem era. Quem diabos ela pensa que é, vindo para cá?
Ela xingou baixinho quando dois homens com câmeras seguiram atrás da senadora.
Chuy cutucou o braço dela. — O que está errado?
— Ali. — Ela inclinou a cabeça na direção dos intrusos. — A atitude daquela mulher. Ela trouxe sua própria equipe de câmera.
— Acabamos aqui, eu direi a Lalo para pegar o carro. Welita não precisa passar por isso. — Chuy correu para Welita, que estava ocupada conversando com o padre.
— Depressa. — Naomi observou a senadora enquanto vinha na direção deles, com os sapatos de salto alto esmagando as pedras que se alinhavam no caminho. Um gigante imenso se arrastava atrás dela. Com seu chapéu de cowboy preto e botas de crocodilo, ele parecia o típico texano, mas o olhar feroz em seus olhos gritava perigo. Ela estremeceu.
— O que há de errado, Mijita? — Welita se aproximou dela. — Chuy diz que você quer ir embora.
— Está ficando quente, e o calor não é bom para o seu problema cardíaco — disse Naomi. — Precisamos levá-la para casa.
Welita parecia desnorteada. — Meu coração está…
— Sra. Duran — Jane chamou.
— Merda — Naomi murmurou baixinho.
Welita se virou e o reconhecimento cruzou seu rosto. — Senadora Sutherland.
Naomi entrou na frente de Welita. — Senadora, não temos nada a dizer a você. — Ela pegou o braço de Welita e virou-a para a direção do carro deles.
— Não, por favor — disse Jane, dando um passo à frente. — Por favor, não se ofenda. Estou aqui para oferecer minhas condolências.
Naomi virou-se. — Você não está aqui por nós. — Ela lançou um olhar para as câmeras de notícias. — Você está aqui para o seu próprio benefício, sua p…
— No seas grocera, Naomi! — Welita repreendeu. — Cuidado com a sua língua.
— Eu sinto muito, Welita. Essa mulher não merece nenhuma gentileza. Ela vem valsando aqui com sua Mercedes chique como se fosse dona do lugar, pensando que pode dizer "me desculpe" e nós vamos acreditar e perdoá-la.
— Essa não é minha intenção. Olhe — Jane respirou fundo —, vamos nos acalmar antes que as coisas saiam do controle.
— Acalmar? Acalmar? — Naomi soltou Welita e deu um passo ameaçador em direção a Jane, com as mãos se fechando em punhos. — Senhora, você não tem ideia do que eu sou capaz de fazer.
— Chuy, pare-a — disse Welita, arregalando os olhos enquanto observava Sal alcançar o interior de seu terno.

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